Os Palhaços faziam e fazem as delícias das crianças e adultos quando é possível assistir a um espectáculo de um qualquer circo que, orbita de terra em terra nas datas festivas e tradicionais.
Apesar da máscara e da figura do Palhaço serem conhecidas nem sempre eram bem representadas visto que os fatos, sapatos e tintas não estavam ao alcance de todos.
É por aqui que consigo escorar esta máscara na vida Caldense especialmente nos pais de alguns amigos que cresceram comigo, tendo mais tarde vindo a continuar a tradição familiar.
Os talvez pioneiros dessa máscara de uma forma mais similar do real circense, foram o Loiça Fina, José David, Pai Pimenta, Carlos Feliciano, Sanches, Pai Felizardo, Pedro Margarido, Viola, José Augusto Nicolau, Carlos Norberto e mais tarde o Leitão, (com o seu Hilman dourado que entrava normalmente no Corso das Caldas da Rainha) César e João Domingos.
Numa das idas carnavalescas aos toiros o Pai Felizardo arranjou umas motas antigas Norton, para chegarem á corrida de toiros de terça-feira de carnaval nas Caldas da Rainha.
Essas motas sofreram uma tropelia do José David que valeu uma grande pancada da perna do Felizardo no passeio no momento de a tentar por a funcionar. Apesar de ser verdadeira toda a gente pensava que era uma brincadeira montada para o efeito, fazendo com que ninguém ajudasse o mascarado, provocando uma risada geral a quem estava por perto.
Mas de todos estes pioneiros o Loiça Fina, era o único que gostava de andar sozinho, sempre com muita graça pelo carnaval, sendo todos os outros adeptos de grupo e de bailes de nomeada na altura, organizados nos seus grupos.
O grupo do Pai Pimenta veio inclusive a receber alguns prémios sendo um deles entregue no Pinheiro Chagas pelo desempenho e visual do grupo no Corso das Caldas da Rainha, outro dos prémios foi ganho no Casino do Estoril pelo grupo, Pai Pimenta, Pedro Margarido, Viola, Nicolau, José David Carlos Feliciano tendo sido aqui que o Joca Pimenta pequenote fez talvez o seu debute nos palhaços.
Esse prémio constou de uma enorme jantarada para todos No Salão Preto e Prata do Casino do Estoril.
Nesses tempos as cabeleiras e alguns adereços eram alugados em Lisboa para serem usados nos dias de carnaval.
Outras personagens tentaram seguir o andamento deste grupo nos carnavais mas rapidamente desistiam após as primeiras núpcias no jantar. Era realmente dura aquela vida.
Existia no entanto algo que para a época era realmente inovador.
Organizavam-se de forma a serem transportados por um condutor de seu nome Vasco Leal, que com a sua paciência e amizade acompanhava sempre o grupo, mantendo-se em condições de fazer a viagem de regresso sem grandes percalços, o que digamos para aquela época era realmente inovador.
A inovação continuou com a forma e o tipo de fatos, com o uso de tintas de teatro e os famosos sapatos compridos, feitos e cozidos à mão pacientemente pelos sapateiros amigos do grupo nas Caldas da Rainha.
Esta comunhão das duas gerações é de facto necessária não só para me enquadrar no tempo e na máscara de Palhaço nas Caldas da Rainha, como para fazer um elo de ligação capaz de juntar várias gerações que usufruíram da incrível onda carnavalesca desse tempo, que nos foi sendo passada no decorrer de todos estes anos.
Num dos dias que nada tínhamos para fazer, andávamos a jogar futebol nas traseiras da Igreja, corria o ano de 1979, sempre preocupados com o Padre Guerra pois não gostava que, os irrequietos jogadores de futebol da altura por ali assentassem arraiais.
Realmente muitos vidros partidos apareceram nas vidraças sem responsável por perto, tal a velocidade com que nos pirávamos após o infame acto de partir um vidro da Igreja, que na altura estavam protegidos por umas encaracoladas grelhas de protecção em ferro pintadas de preto.
No Carnaval, era comum os mais novos darem largas à sua folia com umas máscaras mais ou menos elaboradas, valendo as horas que saltávamos ou no Corso que o Sr. Alberto Saramago e os seus amigos conseguiram manter durante anos em funcionamento como um dos melhores desfiles alegóricos e críticos da região centro (na altura o carnaval de Torres Vedras era já um dos melhores) ou nos variados bailes que se realizavam na altura, adaptados a todos os tipos de bolsos, (Casino, Lisbonense, Bombeiros, Columbófila, Pimpões entre outros)
Foi nesse dia que reparamos na passagem de dois palhaços, viria a saber mais tarde que um era o Sr. º César e o Sr. Leitão. Aquele momento catalisou-me a curiosidade para aquela máscara que me viria a marcar durante imensos anos.
No dia seguinte e numa conversa com o meu amigo Joca Pimenta, soube que ele se mascarava regularmente com o grupo do Pai.
Passei uma tarde a ouvir o resultado das diabruras das noites de carnaval desses tais grupos, que era marcado pelo Pai Pimenta, e mais tarde pelo Leitão, que além de entrarem no Corso faziam a sua passagem com o bestial Hilman Dourado descapotável do Leitão pelas Caldas durante a noite, fazendo depois uma passagem em quase todas as capelinhas de diversão nessa época .
Após alguns acertos e desacertos, arranjámos um fato de palhaço que teria de ir buscar a um dos elementos desse grupo que me valeu uma espera, diria mais uma seca de 4 horas sentado num sofá à espera que alguém acordasse, até que finalmente o fato me apareceu à minha frente.
Foi nessa noite o meu baptismo de mascarado na personagem de palhaço, com as pinturas, jantar e respectiva indumentária feitos na garagem da casa do Leitão, onde se respirava Carnaval e esta dinâmica de mascarados.
Nessa noite foi um mergulho na arte de rir e de fazer rir, tais as gargalhadas que soltei, ao ver o desenrolar dos elementos do grupo, que estavam a 55 rpm e completamente adaptados à máscara com a respectiva voz digna do Palhaço Quinito do Circo Mariano.
Após as pinturas e a tripulação composta do famoso Hilman dourado com umas portas dignas, feitas de umas cordas grossas brancas com terminais de ganchos também eles dourados, fomos descendo desde a Encosta do Sol até pararmos na Praça da Fruta, sítio de paragem obrigatória, onde os mascarados se encontravam, antes de definir para onde se encaminhavam.
Decidiram rumar até ao baile da Columbófila, que era feito no pavilhão quase novo por detrás das instalações antigas. Entradas pagas e fórmula 1 estacionado, (que era quase sempre necessário empurrar, pois o tempo que ficava parado durante o ano deixava marcas) entrámos no ringue do pavilhão onde se fazia o Baile.
No meio de músicas brasileiras e casais de dançarinos que saltitavam entre empurrões e gritos produto dos encontrões e espetadelas dos ornamentos de carnaval das máscaras uns nos outros, fomos deslizando pela zona de dança como podíamos, até encontrar alguém que nos guardasse a panóplia de adereços.
O Joca mais habituado a estes andamentos, encaminhava-me pelo meio dos dançarinos entre apalpões e toques na cabeleira que naquela altura já me fazia sentir uma panela de pressão tal o calor que aquilo me fazia.
Após umas horas e umas belas minis a voz rouca comum nos palhaços começou a despontar de tal modo que até eu me admirei da voz. As músicas, calor, odores e gargalhadas foram a minha companhia por algum tempo.
Houve tempos que deixei de estar em contacto com o Joca e o resto da trupe, que passada uma centena de músicas e de danças com quem não conhecia (o importante era dançar) deram comigo e apanharam-me pelo cachaço pois de modo algum as vozes que eram necessárias para me convencerem a ir para casa eram interiorizadas por mim.
Bom…… foi um baptismo de máscara de palhaço, violento que me valeu um dia inteiro a dormir com as tintas muito mal tiradas da cara e um acordar doloroso com a voz da minha mãe a perguntar se queria jantar ou se ficaria naqueles preparos o resto da noite.
Desde esse dia ficou enraizado este costume de máscara de Palhaço no carnaval, que me tem vindo a acompanhar com o passar do tempo, somente com uma interrupção de alguns anos.
No ano seguinte, mascarámo-nos na casa do Luís Barreto. O grupo era composto pelo Joca Pimenta, Luís Barreto, Carlana e Jaime Amante, que viria a ser mais tarde o “ Bombero Torero” da trupe de Anões Espanhóis, trupe essa que viria a ter imenso sucesso, durante anos.
O engraçado de tudo isto, começa com o debute dele (Jaime Amante) nesse ano, pois não manifestava nenhum jeito para a “coisa”, manifestando mesmo uma depreciativa ideia da máscara. Jamais imaginaria que iria ser um dos seus sucessos no futuro.
O Jaime Amante era um amigo do Grupo de Forcados das Caldas que estava ligado ao mundo do espectáculo dos Toiros e dos matadores de Toiros, nomeadamente como moço de espadas. Visitava as Caldas nas fases festivas ou de dias de corridas com o Grupo.
Nesse ano na novilhada de Carnaval fomos para a Trincheira, onde nos metemos num burladero que nos serviu de base para a secção de escárnio e maldizer, pois que o estado de aceleração em que já orbitávamos, não deixou passar em branco algumas pernas e alguns sorrisos mais atrevidos, só desculpados pela data que vivíamos.
Recordo-me que alguém nos tirou uma fotografia no final da novilhada à porta dos Cavalos. Essa tarde foi algo atribulada já que fomos despachando para as bancadas os nossos apetrechos de mão, bem como parte dos sapatos.
Mas o Carlana apareceu com duas vassouras, fundamentais para nos equilibrar uns nos outros na altura após o final da novilhada ficando o pachorrento e paciente do Luís Barreto, com as mãos nos bolsos no meio do grupo, mas com o disco riscado na parte da pergunta ao fotógrafo….tenho de pagar a fotografia? …tenho de pagar a fotografia…tenho de pagar a fotografia…. Estando ainda hoje à espera da resposta que não lhe foi dada.
Nesse ano o carnaval foi passado com este grupo, por sítios que eram normais nessa altura, Corso, Green Hill, Inferno da Azenha, Ferro velho, Bombeiros entre outros.
Todos os anos a partir da passagem de ano a conversa era muitas vezes direccionada para os preparativos do carnaval. O sítio de eleição era a porta da Câmara que ficava imediatamente a seguir à porta da Zaira.
Nesse ano tudo estava a decorrer normalmente, quando o carnaval surgiu no calendário. A primeira saída era sempre na sexta-feira, dia esse que era de poucos mascarados mas servia para nos adaptar à época, fazendo-nos deambular pelas Caldas sempre depois de um jantar de início de festas, mascarados a rigor.
È nesse ano que o Presidente da Associação Planalto da Nazaré telefonou ao meu amigo Joca, em desespero, visto que a trupe de animação que iria ter a sua apresentação no domingo de carnaval na praça da Nazaré tinha sofrido um acidente de viação em Espanha, não podendo vir fazer a sua actuação.
Nesse telefonema sondou a possibilidade de se arranjar outra solução para a situação visto que já estavam muito próximo da data. Essa sugestão apareceu com a disponibilidade do Joca em falar comigo para uma possível actuação nesse Carnaval na praça da Nazaré.
Bom, quando me foi proposto a hipótese fiquei receoso, pois nunca nenhum de nós se tinha dado a esses andamentos, mas enfim, aceitámos e ficou decidido que à hora e no dia definido de Domingo de Carnaval lá estaríamos.
Depois da proposta aceite, para a referida actuação na praça da Nazaré na tarde de Domingo de Carnaval, prontamente catalisada pelo Pai Pimenta sempre disposto a essas brincadeiras. Recordo-me que eu e o Joca, que nessa fase já andávamos pelo Forcados, nos rirmos com a ideia.
Mas após as perguntas que achamos necessárias com base na nossa inexperiência nestas andanças, ficámos a saber que iríamos ter como suporte uma panóplia de equipamentos de actuação na arena, tais como:
Baloiços, Barris, Bidões de 200 litros, Cavalos de Madeira feitos com cabos de vassoura, Baldes com pó de talco, Tesouras, Pentes e Navalhas de barba gigantes para a referida operação à vaca que nos iria calhar em sorte.
No dia D, preparámo-nos e vestimo-nos nas Caldas. Como não tínhamos ainda carta de condução o Carlos Feliciano foi-nos levar à Nazaré, seria o nosso Apoderado. Após algumas combinações a caminho da Nazaré com o nosso afamado apoderado ficou no ar que iria ser algo de que decerto nos iríamos lembrar durante muitos anos, logo não seria necessário preocuparmo-nos com o que nos iria sair na praça. Decidimos não ir ver a vaca aos curros pois poderíamos ter algum receio depois de a ver.
Ao entrar na Praça de Touros pela porta dos cavalos, logo se ouviu a pronúncia nazarena “….. Ahhh…Joãoooooooooo deixem passar os Artistasssss ohhhhhhhhhhhhh…… “
A praça estava cheia, o barulho de fundo era de alegria e de sons de cornetas, rocas e martelos de carnaval.
Mantivemo-nos por aquela zona pois teríamos de ir fazer as cortesias com os respectivos sapatos xxxxxxxllllllllll. O Inteligente, (Director da corrida) mandou tocar para a saída das cortesias.
Lá fomos saindo quando chegou a nossa vez, eu com o meu andar desengonçado, não ficando atrás o Joca com os seus pés “Dez para as duas “e as respectivas barbatanas nos pés e as tintas de Teatro na cara que nessa tarde usámos, para que não ficassem esborratadas.
Quando chegou finalmente a nossa vez, que aconteceu após um toque de cornetim, com uma melodia mais voltada para a época de Carnaval, entrámos na arena por um dos burladeros que existia na altura para a actuação.
O baloiço tinha sido montado no centro da praça mesmo em frente aos curros de onde sairia a Vaca.
O baloiço era do tipo de alavanca somente com um braço em que cada um de nós se agarrava a uma ponta e rezava para que o outro pendurado no outro extremo o puxasse.
Cada um de nós agarrou-se a um dos extremos do baloiço esperando pela abertura da porta dos sustos, esperando pela decisão de investida da vaca.
A Vaca saiu finalmente após a abertura da porta dos sustos, saindo com todo o gás que tinha em direcção ao baloiço, escolhendo o Joca para a sua primeira investida.
Claro está que a partir dali foi um sobe e desce até que as forças e o hilariante da situação nos começaram a atraiçoar e começaram a surgir uns “puxaaaaaaaaa…puxa…..puxaaaa” mais aguerridos pois começámos a levar de todos os lados que a vaca vinha.
Já não tínhamos força para nos puxar um ao outro o que provocava gargalhadas e gozo nas bancadas, até que, numa das vezes que a Vaca saiu da zona do baloiço deu tempo para me esconder dentro de um bidão.
A vaca não perdeu a oportunidade para responder, com mais uma boa dezena de investidas que me valeu quase uma volta à arena com a vaca a empurrar-me.
Recordo-me que quando parou, estava completamente tonto, tendo ficado agarrado uns segundos à trincheira até recuperar o equilíbrio, enquanto o bandarilheiro de serviço fazia passar a vaca pelo capote e o Joca fazia uns quites á vaca, num jogo de aparece e esconde.
Depois de recuperado começámos a tourear a vaca com um capote, em que o movimento feito por nós ao afastarmo-nos deixava a vaca passar pelo meio, altura em que lhe dávamos umas palmadas, escondendo-nos rapidamente atrás do capote para que a vaca voltasse a investir do mesmo modo.
Entre marradas, desequilíbrios e corridas para a trincheira, tivemos de pegar a vaca pois estava previsto uma barrela à barba da Vaca e não havia outro modo, pega feita e imobilização da Vaca executada, isto tudo feito com as gargalhadas a saírem-nos sem controlo.
Iniciámos o escanhoar com uma pasta branca que nos foi dada pela organização, tendo terminado a função após o respectivo barbear com a navalha de barba gigante e um novo penteado no pelo da vaca onde deixámos presos com um elástico uns óculos de sol de plásticos verdes que fazia parte do kit, desorganizado de uma mala enorme.
Estávamos no fim da actuação e naturalmente começámos a agradecer ao público dando a volta à arena após toda aquela loucura, quando, com alguma surpresa nossa, recebemos um toque de aviso do director da corrida, dizendo-nos que teríamos de pôr um par de bandarilhas na vaca de modo que fosse considerada lidada…Bom, isso não estava previsto por nós.
Por sorte e após o final dos treinos dos Forcados simulávamos estes kits em amena brincadeira, pois eram necessários para enganar a vaca de modo que nos desse tempo para a bandarilhar.
Após algumas falhas de propósito com as respectivas bandarilhas espetadas no chão da arena o Joca, fez um kit á Vaca que a deixou á minha frente e zás, bandarilhas espetadas e loucura terminada, após a vaca ter entrado nos curros outra vez.
Aí sim, demos uma volta à arena agradecendo àquele público da Nazaré tremendamente carnavalesco, que nos brindou com a sua alegria. O nosso cachet foi seis mil escudos quiçá a maior quantidade de dinheiro que ganhei a rir-me.
Durante anos o grupo de Palhaços, ia tendo pessoas diferentes, umas por afastamento profissional, outras por modificação familiar ou estado civil e outras ainda pelo afastamento geográfico que tornava difícil a junção nessa data.
É por essa altura que começaram a aparecer grupos de palhaços mais ou menos organizados, sendo um dos seus promotores o Joca Pimenta, Luís Rocha, Eu, Agapito filho, Felizardo filho, estou a referir-me a grupos de palhaços da nossa geração, pois outros grupos continuavam, mas com pessoas da geração dos nossos pais, penso que o Loiça Fina deixou de se mascarar á poucos anos.
O Joca Pimenta foi talvez o indivíduo da minha geração que mais catalisou a máscara de palhaço, não só pelo início mas pelo seu contacto com pessoas que convidava a partilhar daquela festa. Seja-lhe feita Justiça, pois que por razões de trabalho deixou de ser possível de nos acompanhar, pois era o disco jokey da Bonnie and Clyde.
O nosso grupo, nesse ano começou uma rotina que viria a durar mais de uma dezena de anos sempre com os mesmos personagens, Paulo Renato, Eu, Rocha e Viticó. Tivemos como base nesse ano o apartamento do meu primo Viticó na Foz do Arelho. Os fatos foram feitos ao nosso gosto em modistas diferentes. Nesse ano ficámos nas Caldas e nas redondezas, pois o Viticó e o Paulo Renato estavam a iniciar-se e foram “apalpar” o carnaval na pele de palhaço.
No ano seguinte o meu amigo Pina, decidiu também mascarar-se o que para nós foi uma surpresa, pois tinha-lhe mordido o sindroma da “ bétisse ” e não o estávamos a ver mascarado de palhaço.
Mas depois de finais de Janeiro, juntámo-nos para decidir o sítio que iria servir de base nesse ano bem como a cor dos fatos e onde os mandaríamos fazer. A minha modista de serviço aceitou de bom grado a entrada de mais dois fatos, mas o Pina decidiu mandar fazer o fato a outra modista.
O grupo de carnaval tinha ficado com mais um elemento, sendo agora necessário baptizar os ditos palhaços. O meu nome desde o início sempre foi “ Croquete ”( os meus sapatos mais pareciam uns croquetes gigantes do que uns sapatos de palhaço ) o Paulo Renato foi baptizado com “ Trotinete “ o Viticó com “ Trompete”, mas para o Pina não conseguíamos arranjar um nome interessante o que nos levou a ficar com esta missão até quase ao carnaval.
Num dos fins-de-semana em que andávamos de casa em casa, calhou em sorte ficarmos na casa do Pina, um apartamento na altura no Avenal. O referido apartamento ainda não estava totalmente mobilado e viríamos a constatar mais tarde que o construtor tinha deixado um erro terrível na instalação eléctrica da sua casa.
O pseudo erro eléctrico ganhava forma com “…A tomada do candeeiro do quarto dele estava ligado á campainha da porta e sempre que alguém tocava à dita campainha a “luz” do candeeiro do meu amigo Pina apagava-se. Esta situação durou anos a deixar de ser assunto de aperto para ele.”
Após uma longa tarde a ouvir música e a cruzar informação das namoradas e dos flirts que entretanto iam acontecendo, decidimos sair em direcção à Zaira. Nesse percurso o Pina desabafa connosco no carro……” estou mesmo entusiasmado com o apartamento só me falta comprar mais uns” Etrómésticos”. Olhámos uns para os outros, soltando de seguida uma magistral gargalhada, tinha surgido ali o nome com que iria ficar baptizado enquanto palhaço “Etróméstico”, mas as surpresas não terminaram pelo nome.
A base nesse ano foi a casa do Pina, onde acampámos durante três noites. A nossa mala era atafulhada com fatos de outros anos e o respectivo fato novo (todos os anos mandávamos fazer um), cabeleiras e apêndices para fazer uns truques trapalhões dignos da personagem de palhaço, tornando o chão do espaço onde nos mascarávamos numa feira de roupa de palhaço, meias, cabeleiras, caixas com tintas, bases, lápis pretos e a imprescindível afiadeira.
Quando estamos a mostrar os fatos do ano, eis que chega a vez do Pina que nos deslumbra com um fato digno do sindroma em que estava mergulhado (bétisse), um fato de palhaço em que o casaco tinha um corte de asa de grilo com um padrão de fundo cor-de-rosa com bolas brancas de alguma dimensão, esse casaco era acompanhado com uns calções verdes florescente debruado com uma fita no seu final do tecido do casaco às bolas, claro está que lhe moemos a cabeça nessa noite especialmente durante as viagens entre os sítios de divertimento.
Esse Carnaval foi marcado pelo debute do Pina que tínhamos de o trazer de todos os sítios quase pelo pescoço pois ele não parava e as tintas e a cabeleira eram mero adereço de ocasião. Nesse ano o grupo ficou mais forte pois funcionámos muito bem.
Nos anos seguintes fomos deambulando de casa em casa, entre cabeleiras feitas dos mais estranhos materiais (esfregonas e carpetes felpudas, por exemplo), jantares e saídas diabólicas para todos os Corsos e festas na zona desde a Nazaré até Torres Vedras que nessa altura, já era o melhor carnaval da zona Oeste, onde as matronas na altura eram já o seu cartão-de-visita.
È sensivelmente nesta fase que a máscara de Palhaço se torna quase obrigatória aos foliões, pelo menos no sábado de carnaval nas Caldas da Rainha. Recordo-me de tentar ver uma máscara diferente na Praça da Fruta e não conseguir, ou seja a máscara de palhaço, foi adoptada por quase todos os foliões durante cerca de três anos.
Num desses anos criámos a nossa base de carnaval na minha casa no Montijo, cidade onde decidi viver por razões profissionais.
Esse ano viria a ser um dos mais diabólicos carnavais de que me lembro. O Viticó, Renato e Pina, apareceram na sexta-feira à tarde, faltando o Luís Rocha que por razões profissionais não poderia ir, prometendo que apareceria na segunda-feira à noite, promessa que aliás cumpriu.
Após as farpelas estarem devidamente acomodadas no chão da sala e dos quartos fomos jantar e apalpar o andamento do carnaval por Alcochete e Montijo, na Renault 4 branca do Paulo Renato sempre conduzida pelo Pina que nessa altura era o único que não bebia umas minis …Nessa noite decidimos não nos mascarar aproveitando para descansar para o outro dia após umas horas de conversa pelo Alcache em Alcochete.
Essa noite valeu uma manhã inteira a dormir, só se ouvindo os primeiros passos por volta da uma da tarde. Esse dia foi o inicio das hostilidades carnavalescas para nós, por terras do Porco.
Após uma tarde em que fizemos as últimas compras necessárias para as pinturas, começámos a mascarar-nos por volta das 19h00, para jantar no Tia Maria, restaurante na altura no centro do Montijo.
Ao entrar no restaurante os empregados fuzilaram-nos com o seu olhar de reprovação, pois de facto não estavam habituados a servir grupos de palhaços.
Mas com os nossos sorrisos e gestos mais adequados à máscara, conseguimos descongelar o olhar e expressão facial dos empregados, que lá nos encaminharam para nos sentar numa das mesas do canto com ampla vista para todo o restaurante.
Lembro-me ainda da sobremesa, um doce fenomenal que comi, de nome serradura real, que me fez tomar por mais umas vezes o caminho desse restaurante após o carnaval.
Nessa noite após o jantar fomos para Alcochete, parámos num bar que ainda hoje existe de nome Alcache que nos fez as honras de carnaval, já que, éramos os únicos mascarados da ocasião, entre uns copos, gargalhadas e umas assobiadelas, lembro-me que houve um grupo de miúdas que se meteu connosco, tendo terminado com umas fotografias já com o Pina dentro do carro a querer sair pelo vidro da 4L.
A noite evoluiu com a nossa passagem pela Banda Democrática e pelo Portugal duas das mais afamadas discotecas na altura pelos lados do Montijo.
O dia seguinte começou mais cedo do que o costume. Decidimos que iríamos ao Corso do Montijo com a nossa arma secreta desse ano. Essa tal arma secreta tinha um nome devidamente adaptado ao seu modo de actuação O “FeroZZZ” .
Um cão em esponja pintado de preto suportado por uma vara de aço que o fazia vibrar e deslizar na estrada tal como um cão de pequeno porte. Após as pinturas e pequenos-almoços despachados, entrámos no Corso, com os respectivos adereços, gaiolas, Ferozz, vara de equilíbrio da garrafa de mini, havendo sempre um que só levava um chapéu de varetas para o suporte do grupo.
O digno fiel tratador da nossa fera nesse dia foi o Pina “ Etróméstico” que com a sua voluntariosa e incisiva energia deambulou pela assistência ao desfile, fazendo soltar gritos de susto a algumas senhoras mais impressionáveis, sendo prontamente acalmadas pelos digníssimos, Croquete, Trotinete e Trompete ora mostrando o imaginável canário na gaiola de porta aberta, ou distribuindo umas festinhas com as luvas de algodão de cor branca.
Esse foi o dia de Corso Carnavalesco que mais sucesso nos proporcionou.
Inclusive tivemos honras de primeira página no Correio da Manhã, com várias fotos na capa e no artigo com o famoso “Feroz” ,a indubitável fera em actuação animada pelo “Etróméstico”, tal foi a empatia que fomos criando conforme as voltas do desfile iam acontecendo.
Essa tarde acabou num café de nome César que ainda hoje existe na praça do centro do Montijo a comer uns pregos. Mas claro a noite estava a entrar e ainda havia muito para foliar, após uma passagem pela base de carnaval, fomos em direcção a Setúbal para a nostálgica Seagull, situada na serra da Arrábida um pouco antes da Figueirinha que infelizmente ardeu há um bom par de anos.
Ai aconteceu o inesperado. Embrenhamo-nos de tal maneira na pista de dança que nos perdemos uns dos outros. Foi preciso passar mais de uma hora para que nos voltássemos a reunir e combinar a nossa saída e regresso de Setúbal para o Montijo.
Bom, sei que chegámos, que nos deitámos, mas ainda hoje não sei como o fizemos, nem mesmo o “Etróméstico” o nosso fiel condutor nos confessou como chegou. Nestas andanças há sempre algo que fica, uma delas foi verificar no dia seguinte que o Trotinete tinha-se entretido a encher a gaiola dos virtuais pássaros de copos durante a noite no Seagull decidindo fazer a viagem de regresso a casa com a respectiva gaiola cheia de copos nessa noite.
Foi uma noite e uma manhã de recuperação que foi interrompida pelo Luís Rocha, fazendo-nos uma visita tal como tinha prometido. A partir daquele momento o “Clarão”, tornou-se num furacão, pois estava de baterias carregadas e cheio de energia para se mascarar.
Tivemos um acordar violento que o Trotinete e o Trompete repudiaram, mandando uns sobreiros e carvalhos de boa rama ao chão. Nesse dia ou melhor nessa noite o Clarão deu largas ao seu apito, em todo o sítio onde ia criando uma má vizinhança, até que entre a passagem da discoteca Portugal para a Banda Democrática com uma passagem por Alcochete sofreu um assalto, feito pela trupe na qual o resultado foi o desaparecimento de tal instrumento de super agudos.
O Clarão ficou inconformado, ficando ainda mais rosado na sua cara redonda que era semi tapada por um chapelito digno do mais delirante ciclista do pelotão da volta a Portugal, voltando a ver o famoso apito somente no dia seguinte.
Esse ano carnavalesco terminou com a despedida destes meus amigos do sítio onde montamos a base no Montijo.
Em Dezembro desse ano o Rui Aniceto, (irmão do Parrila, que na altura era um dos sócios de uma discoteca do Montijo de seu nome Alcunhas) pediu-nos ajuda para a festa de natal das crianças da empresa onde trabalhava. Sondei o Pina para me fazer companhia na actuação.
O meu amigo Pina nem pestanejou aceitando logo no momento do convite. Esse final de tarde valeu-lhe uma enorme dose de farinha branca e água por cima da cabeleira e das calças. Essa foi sem dúvida talvez a última brincadeira mais elaborada em que participamos.
No decorrer do ano seguinte, algo viria a acontecer que iria abalar todas estas personagens.
Num dos dias mais tristes desta minha vida, um dos elementos do grupo sofreu um acidente de viação grave que lhe ceifou a vida. Foi algo que me abalou, sacudiu e fez-me mergulhar numa tristeza que me inibiu durante mais de uma dúzia de anos de me mascarar. Tínhamos perdido o “Trompete” ….Esse episódio foi marcante e castrador emocionalmente para todos nós.
A “TI” meu querido amigo Viticó dedico, esta crónica de passagens carnavalescas, sorrisos, partidas e malandrices que tão bem fazíamos e dos quais eras sempre um dos mais disponíveis para o fazeres.
Até um dia desses Primo “ VITICÓ “.
Um muito OBRIGADO ao Pai Pimenta, Mãe Pimenta e ao meu grande amigo Joca Pimenta pela ajuda necessária para conseguir sincronizar alguns anos de Carnaval entre as duas gerações.
Post de António J.F. Albano
1 comentário:
Dos grupos de palhaços dos primeiros tempos, também me lembro do sr. Campos e também mais tarde do seu filho.
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