terça-feira, 3 de agosto de 2010

DESVENTURAS DE UM ESTUDANTE EM TORREMOLINOS EXCURSÃO DE 1980 - PARTE 3



Resumo dos capítulos anteriores:

Estamos na Páscoa de 1980. Os finalistas do Liceu das Caldas partem em excursão para Torremolinos. Mal chegámos e já estávamos a correr as discotecas da cidade. No regresso ao nosso apartamento em Benalmadena, descobrimos que a piscina do complexo está cheia e que uma das banhistas era a minha namorada do Verão de 1979. Ao debruçar-me para a beijar, o Filipe do Pó atira-me para dentro de água, todo vestido.

No dia seguinte fomos ao Corte Inglês de Malaga e assistimos a uma cena de histerismo das fans de Pedro Marin. Para acabar o dia fomos afastados de um jantar no apartamento de umas amigas da onça mas o feitiço voltou-se contra o feiticeiro.

Perceberam? Não? Então leiam os capítulos anteriores que a mim já me basta ter de arranjar tempo para escrever este!

Parte três:

Os dias sucederam-se a um ritmo vertiginoso e depressa demais para o nosso gosto. Dormíamos pouquíssimo e apenas nas horas mortas por forma a estender ao máximo o nosso tempo útil de diversão.

Dividiamo-nos em grupos e enquanto uns iam às praias do Lido, de Bajondillo e de La Carihuela ou permaneciam na piscina, outros passavam a tarde nas esplanadas da Calle de San Miguel ou participavam em excursões a Mijas, Marbella e Puerto Banus.

À noite percorríamos as discotecas de Torremolinos e regressávamos a pé a Benalmadena. Muitos estudantes de outras localidades optavam por alugar motocicletas e conduziam-nas com dois e três passageiros sem qualquer tipo de protecção.

Uma noite regressávamos a Benalmadena pela Avenida de Palma de Mallorca e a meio caminho recebemos a noticia de um trágico acidente de mota envolvendo dois estudantes de Torres Vedras. Por uma vez a noite acabou triste e pesarosa para todos, perdendo nós a vontade de a estender nas nossas farras nocturnas que normalmente teminavam com o nascer do sol.

Num final de tarde um grupo vem a correr até à piscina para nos chamar. Entre risadas contam que estavam a vaguear pelas calles quando entraram num bar chamado Bonanza, entre eles estavam o João Gancho e a acompanhá-los o Padre Eduardo.

O barman era um transformista chamado Miguel, Miguel do Bonanza como era conhecido e que quando se transvestia assumia o personagem de ''Agata''.

O João Gancho picou-o para se ir mudar e o Miguel do Bonanza ficou todo dengoso com o João que se fartou de gozar incitando-o a encarnar o seu personagem. O bom do Padre Eduardo bem que tentou afastar o grupo do bar mas o mais que conseguiu foi ele próprio se retirar deixando o grupo entregue à sua diversão.

Fomos a correr assistir ao pagode e ainda apanhámos a ‘’Agata’’ a dançar umas sevilhanas para o João. No final da tarde tivemo-lo que o proteger das insistências do travesti que queria à força dançar mais umas músicas para o João.

Nessa noite fizemos mais uma rodada pelas discotecas, acabando como sempre no Piper’s.

Há muitas noites que um grupo de miúdas de Oviedo, nas Astúrias, também em excursão de finalistas, rondavam um dos grupos de rapazes do liceu das Caldas, metendo conversa com eles e sistematicamente pegando nas suas bebidas para irem matando a sede sem ter pagar as suas próprias bebidas, bem, ou era essa a razão, ou encontraram assim uma forma de se colarem ao grupo. Era vê-las sempre a dançar junto aos caldenses no patamar diante do famoso biombo das dançarinas e nunca entrando nas pistas de dança.

Este grupo era formado entre outros pelo Tó Zé Faustino do Bombarral, pelo Paulo Renato Castro e pelo José da Silva. A determinada altura já fartos da insistência das raparigas em pegar os copos das suas mãos e bebericarem deles, decidiram pregar-lhes uma partida.

De cada lado dos três ou quatro degraus que davam para esse patamar, haviam uns pequenos lagos com nenúfares e algumas trepadeiras. Invariavelmente esses pequenos lagos terminavam a noite apinhados de copos pois à falta de outro local para os pousar e uma vez vazios, era aí que todos os depositavam.

A água continha muitos elementos vegetais em suspensão dando-lhe uma cor verde. Assim numa noite, os rapazes decidiram encher os copos com essa água sabendo o que aconteceria pouco depois.

E assim foi! Uns minutos depois eis que chega o grupo de espanholas e recomeça a dança, com elas a bambulearem-se à sua volta e a pedirem-lhes os copos para bebericarem.

‘’ - Tiene un color hermoso. ¿qué es?’’

‘’- Pisang Ambon!’’ – retorquiram os rapazes com um tom meio enfadado, meio contido.

As raparigas beberam e não se desfizeram! – Uma até disse que era muito bom.

Tivemos que nos virar para esconder o riso! Não me recordo já se lhes serviu de remédio ou se os rapazes lhes ofereceram por uma vez as bebidas.

Ai! Longas eram as noites!

Na tarde do último dia chego aos apartamentos e encontro no hall do meu piso um grupo de colegas formado pela Rosa e pela Paula da Columbeira, pelas Susanas, pela Fátima, pela Teresa Requeijo, pela Margarida Rosa e pela Heloísa. Algumas delas, não me lembro de quais, pois os seus apartamentos eram anexos, tinham ficado do lado de fora do seu apartamento pois repartiam-no com uma colega e esta tinha vindo mais cedo da piscina com as chaves e agora não lhes abria a porta.

Batiam na porta, tocavam à campainha e nada!

- Têm a certeza que ela está aí dentro? – perguntei eu.

Que sim, responderam-me. Se tivesse saído teria deixado a chave na recepção como era habitual.

- Deve estar a tomar banho e não vos ouve! – conclui eu.

Que não, reponderam elas. Já estavam a bater há muito tempo e ela sem abrir. Começavam a ficar preocupadas.

Nisto, uma delas lembrou-se que tanto a sua janela que dava para a varanda como a janela do apartamento do lado estavam abertas.

- Paulo! – pediram-me elas lançando-me o seu ar mais charmoso! – Eras um querido se passasses de uma varanda para a outra e nos abrisses a porta.

- Devem estar malucas, ainda caio lá em baixo!

- Não cais nada! Saltas pela divisória! – disse-me uma com ar despreocupado (pudera, não era ela a saltar!) – E se alguma coisa tiver acontecido é melhor seres tu a dar com ela!

- Ai parva! – interrompeu logo uma, vendo que o argumento não me iria convencer – Ela deve é estar a dormir ferrada!

Acabei por aceder ao pedido e fui até à varanda do apartamento que algumas ocupavam, mesmo ao lado do apartamento trancado. As varandas estavam divididas por muros que impediam a vista de uma para a outra, resguardando a privacidade não só das varandas mas também dos quartos e salas. O pior é que entre cada varanda havia ainda um pequeno espaço de alguns centimetros e podia mesmo ser perigoso se não saltássemos junto à parede.

Bem, lá foi o Paulo armado em Arsene Lupin, e toca de subir a uma espreguiçadeira e daí para o muro.

Quando estou no topo do pequeno muro descubro a razão porque a menina não ouvia o bater da porta.

Ao saltar por cima do muro deparo-me com uma visão fantástica!

Uma linda moçoila de olhos fechados a apanhar sol em topless, com duas meias cascas de tangerina a proteger as partes mais vulneráveis ao sol. A sério, foi lindo!

O que fazer? Volto para trás e corro o risco de ser apanhado de costas ou entro rapidamente para a sala que estava mesmo ali à mão?

Decido-me por esta alternativa. E esgueiro-me em bicos dos pés para a sala, não sem antes deitar uma última olhadela à Vénus Adormecida.

Abro depois a porta e deixo-as entrar perdido de riso. Mais uma vez fico guardião de um segredo da excursão! Quem seria a misteriosa dama do monoquini?

Haveremos de nos encontrar todos uma hora mais tarde.

Não sei como começou mas sei no que deu!

Estávamos no nosso apartamento a recuperar forças para o que seria a nossa ultima noite quando ouvimos uma grande algazarra. Saímos de imediato do apartamento e deparamos como uma autêntica cena de guerra, por todo o lado e em todos os pisos haviam rapazes e raparigas a degladiarem-se com extintores de incêndio. Era uma fumarada ou melhor uma polvilhada tal que parecia que os halls estavam imersos em nevoeiro!

Toda a gente parecia moleiros, enfarinhados de alto a baixo!

Foi o bom e o bonito! Não havia nada a fazer pois quem não entrava na festa só tinha duas alternativas: ou reentrava nos apartamentos e esperava pelo fim do motim ou deixava-se fumegar passivamente!

A brincadeira acabou com a chegada dos seguranças e uma convocatória geral para o hall da recepção onde nos esperavam a administração do empreendimento, que nos pretendia (a todos, de todas as escolas) expulsar na hora, os professores que acompanhavam as diversas escolas e ainda um corpo policial.

Enfim, a última grande reprimenda da minha vida!

À chegada, quando fizemos o check-in, alguns de nós, tinha visto o seu BI retido na recepção como garantia para evitar ou compensar eventuais danos. Bem, eles não estavam a pensar neste tipo de danos!

Às tantas já tinhamos algumas raparigas a telefonar para os pais a dizerem que iriamos todos ser expulsos de Espanha... e sem bilhetes de identidade!

Lembro-me que alguns pais estavam mesmo dispostos a meter-se a caminho para resgatarem as suas filhas das garras dos nossos ‘’captores’’!

Os que fazíamos parte da Associação de Estudantes começámos achar tudo aquilo um exagero e tanto mais que os estudantes das Caldas eram dos menos culpados da situação. Fizemos tudo em legitima defesa!LOL!

Com a ajuda dos nossos professores e do responsável da agência de viagens conseguimos dialogar com os administradores do empreendimento e lá conseguimos que libertassem todos os BI com excepção do meu e não sei se do Paulo Lemos que era o Presidente da Associação e que teve um papel de destaque nessas negociações. Deveria ter ido para a carreira diplomática, o nosso Paulo!

No final lá passei clandestino a fronteira. Julgo que foi a primeira vez na história que um português passou a fronteira na clandestinidade...

...no sentido Espanha-Portugal!
















Lipps Inc. - Funky Town (1980)



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