sexta-feira, 9 de julho de 2010

A VOAR NAS ASAS DA AVENTURA

 As Famosas Sapatilhas que nos fizeram percorrer centenas de KM`s.............. :):)



Corria o ano de 1979 o Inverno não estava a ser muito frio. O primeiro período do Ano Lectivo na Rafael Bordalo Pinheiro estava a decorrer muito bem e o pós Escola estava a ser fabuloso. Treinava duas modalidades, Voleibol na casa do Benfica (Terça, Quinta e jogava aos Sábados) e Andebol no Sporting das Caldas (Segunda, Quarta e Sexta e jogava aos Domingos).

Naquela altura equipamento desportivo de topo não havia nas Caldas, todos nós continuávamos a saltar e a competir com as velhinhas Sanjo (sapatilhas) que com a sua palmilha ergonómica nos ia ou deformando os pés ou minorando os impactos com o solo.

É numa destas equipas (Sporting das Caldas) que me cruzo com o meu grande amigo Joca Pimenta, nessa altura éramos os mais novos dessa equipa de Andebol que o Nunes da pequena Papelaria entre a Tália e a Taiti da rua das Montras, teimava em manter em condições de competição, tais como o André, Pedro, Chico Carrilho, Nelson entre outros, todos eles mais velhos do que nós o que nos valeu uma época de calduços e beliscões nos treinos de ataque, defesa e permeabilidade do Pivot.

Foi decerto um ritual entre atletas que passámos com alguma irreverência e troca de mimos. Durante os treinos, também nos “esquecíamos” de vez em quando de parar o braço ou o joelho forçando o contacto físico possível com os mais velhos, fabricantes dos calduços.

Foi por essa altura que surgiram noticias desportivas a nível internacional, poderemos mesmo dizer uma enorme surpresa, a Selecção Nacional de Voleibol Cubana sagrou-se campeã Mundial, contrariamente ás expectativas, pois a média de alturas era de 1,73m, mas saltavam e tinham uma capacidade de impulsão inacreditável, que aliado ao baixo centro de gravidade produziu uma equipa de eleição.

A imprensa desportiva empolou esse fenómeno, já que as outras equipas tinham como média de altura 1,99m, esse caso não nos passou despercebido tanto a mim como ao Joca. O que nos motivou imensas horas de conversa, empoleirados nas nossas motorizadas à porta do Pavilhão Desportivo da Mata uma Sirla com motor Casal de 5 velocidades e uma Boss com motor Casal de 2 Velocidades, kitada com um cilindro de 5 velocidades.

É numa dessas conversas que chegamos à conclusão que todos os Jogadores Cubanos contrariamente às outras equipas utilizavam, umas sapatilhas da marca Tiger (o nome Asics, já aparecia na marca, mas num tamanho muitíssimo pequeno). Foi numa dessas secções de conversa de pós treino na Mata que o Joca propôs uma ida a Badajoz em busca de umas sapatilhas dessa marca e devidamente adaptadas ao andebol que nos poria a saltar muito mais que os mais velhos…

Após amadurecida a ideia, entre nós com a parte Logística devidamente planeada, decidimos pedir aos nossos Pais, e ai começam as primeiras chatices, pois o nosso pedido para fazer uma viagem de motorizada Caldas /Badajoz, não foi bem aceite, mas após alguns forcing´s da nossa parte, lá veio o despacho positivo da entidade Paternal.

A viagem só poderia ser feita nas férias escolares, tendo ficado decidido entre nós que a iríamos iniciar numa quarta-feira, na semana de férias antes do Natal.

Nesse dia levantamo-nos cedo de modo que começássemos a viagem por volta das 9h00 da manhã e foi, realmente isso que fizemos.

Tínhamos preparado as”máquinas” na véspera, com o saco de viagem amarrado com uns elásticos no sítio do pendura, depósito de combustível cheio, níveis de óleos e pressões de pneus, no top.

Às 9h20 começamos a viagem, passamos o quartel do exército, nessa altura ainda RI 5, iniciando de seguida a subida das Gaeiras é ai que a Casal Boss do Joca decide não colaborar e pára. Bom, ficamos incrédulos, mal tínhamos saído das Caldas e já tínhamos ficado apeados. Decidimos rapidamente voltar para trás em direcção ao Pina que na altura tinha uma oficina de bicicletas e motorizadas, na rua do Parque.

Tanto lhe moemos a cabeça que ele acedeu em retirar o motor e repara-lo, com o material que tinha em stock e assim o fez, mas a meio da reparação deparasse com um valader partido que não iria permitir seleccionar as duas mudanças, tendo o Joca decidido ficar só com a segunda mudança. Almoçamos por ali mesmo, tendo como ementa o lanche para a viagem.

Durante esse tempo de reparação da Boss nada dissemos aos nossos Pais, por volta das quatro da tarde finalmente a Boss do Joca estava a trabalhar, mas somente com uma mudança, e foi assim, que nos piramos para Badajoz.

Verificamos logo que nas subidas mais inclinadas a Boss não subia, o que valeu ao Joca voltar para trás varias vezes para ganhar uma velocidade que lhe permitisse voltar a subir, com sucesso aquele espaço. Com o decorrer da viagem, e passado a zona da Espinheira, Cercal, Alenquer, surgiram finalmente as rectas de Vila Franca que nos iriam, fazer descansar um pouco.

Quando passamos o Porto Alto já íamos de luz ligada, ou seja era essa a hora que tínhamos previsto chegar a Badajoz e ainda estávamos no Porto Alto. Era Inverno e essa noite estava a fazer jus à estação. Apesar de levarmos, uns casacos o frio estava ali a fazer-nos lembrar que teríamos de nos proteger ainda mais.

Continuamos a viagem sem mais paragens, em direcção a Pegões, eu ia à frente tipo batedor, pois a minha luz era mais eficiente que a da Boss que mais parecia um pirilampo irritado que não parava quieto sempre aos tremeliques

Até que de repente como que acordando de uma melancolia provocada pela recta, sempre apadrinhada pelos pinheiros mansos que ainda hoje continuam a fazer sombra à estrada, olhei para trás massssssssssssssss, o Joca não estava lá, não me seguia….voltei de imediato para trás e encontrei o Joca uns seis quilómetros atrás, com cara de poucos amigos, dizendo-me que tinha gritado e que eu não tinha ouvido…Existia então outro problema com a famosa Boss, tinha furado…a roda traseira.

Bom, para aquele problema a nossa logística tinha resposta e lá começamos a retirar a roda, só que o frio estava a marcar presença de uma forma que os nossos dedos não tinham capacidade de resposta e pouco tempo depois, deixamos a reparação do furo pois os dedos já não nos respondiam, estavam brancos….foi ai que começamos à procura de lenha para fazer uma fogueira para que conseguíssemos aquecer as mãos e aquela zona onde estávamos.

A lenha que conseguimos reunir estava molhada ou húmida e da maneira convencional com fósforos não conseguíamos fazer com que a combustão se mantivesse, foi preciso retirar o tubo de gasolina da minha Casal e canalizar alguma gasolina para cima da lenha para que finalmente a fogueira ganhasse chamas para nos aquecer, pois a hipotermia estava muito perto.

Ganha a batalha da temperatura, remendámos o furo à luz da fogueira, ficando à sua volta pelo menos meia hora, tempo suficiente para nos recompormos e secarmos a roupa molhada entretanto por um aguaceiro que nos brindou com a sua passagem.

Metemo-nos a caminho e a partir dali o Joca foi à frente, ficando eu na posição de seguidor. Foi dessa forma que seguimos por Pegões, Vendas Novas, Estremoz, Arraiolos, Terrugem (sitio onde o Pai do Joca nasceu), e finalmente chegamos a Elvas, à casa do tio do Joca, quase brancos de frio.

O tio do Joca alguns minutos depois, perguntou-nos como é que nós tínhamos ido. Explicamos ao Sr. que tínhamos ido de mota, ele ficou preocupadíssimo e desceu rapidamente, pelas escadas para nos ir guardar as famosas Bombas, mas para grande espanto nosso, voltou pouco depois, dizendo-nos” …bom naquelas bicicletas ninguém pega ….”Com a sua pronúncia alentejana.

Estávamos de tal maneira cansados que, mal nos deitámos, adormecemos tipo pedra do período jurássico. No dia seguinte, vestidinhos de novo, lá fomos fazer a famosa compra das sapatilhas Tiger, eu com um blazer e uma camisa cinzenta (completamente desajustado) o Joca de pulôver à pipi do ténis.

Nessa altura tínhamos de parar na Fronteira para mostrar os documentos, o Guarda fronteiriço que nos fez o check in, olhou para as tais “bicicletas” perguntando-nos em ar de gozo…”mas vocês vieram das Caldas da Rainha nisso?..” nós com um ar de inocência, rimos e respondemos com o capacete na cabeça, abanando-o no sentido de cima para baixo, confirmando a resposta da pergunta.

Chegados a Badajoz, era a minha primeira vez por terras do reino de Leão, descobrimos logo que não era preciso usar capacete para circular nas tais motorizadas, visitamos alguns centros comerciais que na altura achei extraordinário, mas ficamos algum tempo pelos Preciados deambulando por aqueles sectores de artigos todos eles muito mais baratos que nas Caldas. Mas de sapatilhas Tiger nada de nada….

Decidimos ir procurar nas Lojas da especialidade, começamos a nossa odisseia das lojas desportivas, até que finalmente deparamos com um representante das famosas TIGER, olhamos um para o outro com um sorriso cúmplice…finalmente elas estavam ali à mão de semear.

Entramos na Loja e remexemos em quase todos os modelos dessa marca, quase que me ia apaixonando também por umas Stan Smith, que estavam ao lado, mas como só tinha dinheiro para um par tive de manter o objectivo que já estava traçado, TIGER. Eu comprei umas Tiger de Desportos de Pavilhão Azuis e o Joca umas Tiger super leves cinzentas.

Finalmente todos inchados saímos da Loja pois tínhamos conseguido as tais Tiger que faziam, pensávamos nós os Cubanos saltar mais alto que todos os outros e além disso tínhamos conseguido o nosso objectivo.

O dinheiro nessa altura já era escasso, mas tínhamos fome, depois de sondar o mercado à volta deparamos com um carrinho de rua que vendia cachorros que eram aquecidos de uma maneira que nunca o tínhamos visto, eram introduzidos num ferro Inox bicudo, depois punham a salsicha dentro desse buraco, começamos a comer os tais cachorros, mas não tínhamos nada para beber fomos andando para baixo na rua em direcção ás “bicicletas” , quando passamos pelo Simago que na altura era Famoso pelos seus batidos, soubemos mais tarde.

Decidimos comprar 1 litro de batido de Morango para cada um que foi dificilmente bebido pelos dois, tal era a dose e a consistência do batido que misturado com o cachorro deu mais tarde muito que fazer.

Voltamos então para Portugal, onde fomos brindados com uma carga de água que nos fez ficar com a roupa toda molhada, mais parecia o festival da camisa molhada, com os bicos dos mamilos a gritarem por piedade, tendo o tal guarda da fronteira feito sinal para passarmos sem parar. O resto desse dia foi passado a adorar as sapatilhas e a secar a roupa que tínhamos toda molhada, bem com a preparar a vinda para as Caldas da Rainha pelo mesmo caminho.

Na manhã do dia seguinte começamos a viagem, sempre com o Joca à frente e agora de dia. Sempre que aparecia uma subida mais íngreme, eu esticava a perna apoiava o pé na parte de trás da Boss do Joca e empurrava-o até ao final da subida, fazendo com que chegássemos a Vila Franca mais cedo do que o previsto por nós, fazíamos 50 km/h o que nos valeu uma viagem de regresso sem percalços com umas paragens para beber agua em algumas das fontes que nessa altura ainda existiam junto às estradas

Com o aumento do trânsito, na estrada nacional que passava por Alenquer, passei num cruzamento à frente do Joca, quando cheguei à saída de Alenquer, olhei para trás e o Joca já não estava lá outra vez, esperei um pouco e lá vinha ele com a sua diabólica Boss, que fez Caldas/Badajoz e Badajoz/Caldas somente com a segunda velocidade…de facto uma resistente, tinha voltado a descer para ganhar balanço para subir a ultima parte da subida de Alenquer.

Até às Caldas, não mais perdi o Joca, tive muito trabalho pelas subidas da Espinheira e Cercal. A minha Casal passou o teste e ainda conseguimos ajudar, devagar é um facto, a Boss do Joca a suplantar as dificuldades das subidas.

As sapatilhas fizeram um furor na altura, aliás acho que somente as descalçava quando tinha que dormir …..mas a tal questão de ajudar a saltar mais alto ..”essa” infelizmente não nos serviu de muito.

Há alguns dias, em conversa com o Joca, verificamos que ainda temos na garagem as famosas “Bicicletas”…quem sabe se não nos iremos por a caminho outra vez, afinal de contas foi há trinta anos …..Como o tempo passa como se nada fosse ……e uma boa aventura é sempre boa de repetir. Bom o elenco está um pouco mais pesado ….e o guarda roupa já não existe….mas há a jovialidade de sorrirmos com isto outra vez ……


Lanço um desafio .....Deixem as vossas crias continuarem a voar............eu fartei-me de Voar nas Asas da aventura...

Equipa de Voleibol da Casa do Benfica

.Nesta foto: Pedro Vilaça, Vilaça, Rui Pedro, Buiça, Paulo Nascimento,
António J F Albano, Paulo Zelú, Adelino, Almeida, Zé Matias, Querido,
António Querido, Nelson, Nelson Verissimo
 
Equipa de Andebol do Sporting das Caldas

.Nesta foto: Manuel Nunes, André, Chico Carillho,
António J F Albano, Nelson, Pedro
 
(post do António José Albano)

1 comentário:

Anónimo disse...

ao ver esta foto recordei a minha infancia em que joguei contigo e brinquei embora seja um pouco + velho jogava eu no scc Zé (pingas) tudo de bom para ti