Descia a correr em bando com os amigos o troço da Aldeia dos Macacos que ia do Casino à Esplanada.
Como habitualmente, no meio de uma jogatana de futebol ou de tiros e flechas dos caubois e índios (eu era o Faca Negra, chefe da tribo dos Facas) eu avistara o meu avô João a subir a alameda na companhia dos seus amigos.
Era já uma tradição diária. Pelas quatro e meia, cinco da tarde, o meu avó e os seus amigos terminavam uma das suas grandes voltas ao parque que se iniciara naquele mesmo local, perto do coreto, e subiam a alameda em direcção Casino. Viravam depois à direita, passando então diante da Biblioteca Gulbenkian, dos Pavilhões do Parque (o antigo quartel que viria a ser Liceu), do Salão Ibéria, dos amigos a bater uma sueca no pavilhão de tiro, pelo roseiral, retornando para a frente do Museu, passando junto à casa dos barcos e parando por um tempo em conversa com outro grupo de amigos.
Como habitualmente, no meio de uma jogatana de futebol ou de tiros e flechas dos caubois e índios (eu era o Faca Negra, chefe da tribo dos Facas) eu avistara o meu avô João a subir a alameda na companhia dos seus amigos.
Era já uma tradição diária. Pelas quatro e meia, cinco da tarde, o meu avó e os seus amigos terminavam uma das suas grandes voltas ao parque que se iniciara naquele mesmo local, perto do coreto, e subiam a alameda em direcção Casino. Viravam depois à direita, passando então diante da Biblioteca Gulbenkian, dos Pavilhões do Parque (o antigo quartel que viria a ser Liceu), do Salão Ibéria, dos amigos a bater uma sueca no pavilhão de tiro, pelo roseiral, retornando para a frente do Museu, passando junto à casa dos barcos e parando por um tempo em conversa com outro grupo de amigos.
Depois continuando sob a pérgola até ao parque das bicicletas e descendo as escadinhas do ténis. Voltavam a parar para apreciar os amigos tenistas e os seus filhos, o Prof. Barreto, o Dr. Calheiros Viegas, o Henrique Mineiro e o Dr. Saudade e Silva, o José Augusto, o Dr. Alcino Coelho, o Sr. Barreto do tribunal (pai do Manel e do Luis da Azenha) o Pinto Ribeiro, o Sena, o Tony Vieira Pereira, o Ramiro e o Paulino, o Néné e o seu primo Gégé, o pai deste, Jorge Sottomayor, o Jorge Salles, o Eurico, o Ai-Tó e o Miguel Sampaio Guimarães, o Chico Carrilho e o Miguel Bento Monteiro e o Rogério Matias, entre tantos outros.
Viravam em direcção ao pequeno lago, onde estão agora mais dois courts de ténis e depois passavam ao longo da rede dos courts do lado do Lisbonense subiam pelas outras escadinhas e entravam na alameda principal, torneando o parque infantil com o seu grande escorrega-castelo de três descidas, o escorrega vermelho mais pequeno, as avionetas vermelhas em baloiço, os outros baloiços, o sobe-e-desce e o carrossel dos cavalinhos, o comboio à entrada, à esquerda, ao lado do trapézio e das argolas sob um suporte azul. E no meio de tudo, o velho ringue de patinagem agora de dimensões mais reduzidas do que outrora fora.
Subiam então a Aldeia dos Macacos passando pela esplanada e pelo coreto onde paravam ganhando forças para um novo circuito.
Eram tardes soalheiras de fim de semana de Verão. A minha mãe e a minha avó jogavam canasta com as amigas no casino e lá em baixo a esplanada enchia-se de outras mães de família em conversa amena enquanto tricotavam uns naperons e pelo canto do olho zelavam pelos seus filhos (os Morgado, Horta, Pereira, Batista e muitos outros) que às dezenas brincavam nas imediações.
O ritual era sagrado. Manhã na praia, aproveitando as marés baixas e caminhando pelas rochas, ou banhos pela mão (o molhar o pé) nas grandes ondas das marés cheias. Manhãs de capacete a brincar às touradas ou a jogar ao prego ou manhãs de sol a comer uma Bola-de-Berlim e a beber uma gasosa no Tábuas azul, junto às escadas de madeira que davam para o largo do Facho. O José Luis , banheiro, montava as barracas brancas com números a cor de vinho e a sua mulher zelava pelo casebre onde depositávamos os enormes sacos de pano onde guardávamos os baldes, pás e colchões de água.
Se almoçávamos na praia tínhamos de ir a correr procurar os pequenos bancos de madeira e os largos estrados de madeira que faziam de tampo de mesa para que os meus avós pudessem comer sentados.
Depois era hora de voltar às Caldas não sem antes ir apanhar mais umas dezenas de caricas no areal por baixo do Tábuas.
Subíamos então as velhas escadas, carcomidas pelo sol, pelo sal e pela areia, passávamos pelo casebre conhecido pela casa dos barcos, onde ainda se alinhavam os dois velhos salva-vidas de madeira, agora destituidos das suas funções pelo asfaltamento da estrada que conduzia ao largo do Facho e pela construção do muro de segurança ao longo da ravina que levava à praia. Seriam precisos oito homens para os remarem e muitos mais para os levar ao areal, à falta dos bois que o faziam originalmente.
Após as 3 das tarde, então sim íamos para o parque, para o casino, onde ficaríamos até serem horas de jantar.
Longas tardes no parque. Pessoas a banhos que alugavam casas e quartos nas imediações do Hospital Termal sentavam-se nas avionetas, os famosos bancos inclinados, ao longo das alamedas. Muitas vezes traziam os filhos, geralmente os netos, com quem estabelecíamos fortuitas amizades de Verão. Vinham as famílias de África onde os pais cumpriam comissões de serviço, e falava-se dos usos e costumes de Angola, Moçambique, Guiné, S. Tomé e mesmo de Timor. Vinham os caldenses residentes nas colónias deixar os filhos com os avós durante as férias ou a preparar o novo ano lectivo. Vinham emigrantes e excursionistas, vinham de todo o lado, visitar as Caldas.
A Aldeia dos Macacos, a velha alameda principal, enchia-se de gente passeando entre os plátanos seculares, jovens estudantes, empregadas domésticas em dia de folga ou fardadas cuidando das crianças e sempre merecendo a atenção dos jovens recrutas do R.I.5, muitos de partida para África e querendo ganhar um novo laço com a metrópole. Madrinhas de guerra, namoradas de guerra!
Por vezes tínhamos a surpresa de um teatro de fantoches, de Robertos, que uns artistas montavam de improvisação, de outra vez era um cigano com um urso amestrado, de unhas limadas e focinho ançaimado ou um tocador de realejo com um macaquinho saguim vestido de paquete de hotel, a recolher as moedas que os adultos lhe deixavam.
Então eu os meus amigos parávamos junto ao grupo do meu avô e eu dava-lhe um forte abraço e o meu avô, como sempre, dava-me um beijo na testa e dizia:
- Deus te proteja e te abençoe!
Nunca me faltou com aquela bênção mesmo que lhe desse mil beijos num dia! Mesmo quando estudava na Universidade e morava na sua casa na Estefânia.
Depois o meu avô levava a mão ao bolso e retirava um pequeno porta moedas de pele castanha e tirava uma moeda de 10 ou de 25 tostões que me dava. Depois voltava a guardar o porta-moedas no bolso para junto de outra carteira onde trazia a fotografia da sua mãe Francisca e uma pequena oração do Padre Cruz. Mesmo ali perto da medalhinha da Nossa Senhora de Fátima que trazia sempre pregada com um pequeno alfinete de dama à camisola interior.
Corríamos então para a esplanada. De cada lado existia um pequeno stand. O primeiro vendia gelados Olá e os pauzinhos podiam conter um prémio, um boneco monocromático dos personagens do Carrocel Mágico, a Anica, o seu cão Franjinhas, o caracol Ambrósio, o feiticeiro mau Saltitão, a vaca Rosália, o coelho Flávio, o Tio Realejo, os amigos Joana e Chico…
O prémio maior era um livro de histórias do Carrocel Mágico ou o próprio Carrocel.
No stand de baixo, no fim da varanda, vendiam-se os gelados da Rajá (É Rajá! É Rajá!) e aqui o prémio eram astronautas e alienígenas sendo o grande prémio (que nunca consegui) a nave espacial que os poderia albergar a todos.
Escolha difícil que tinha que de fazer todos os dias!
Os anos foram passando, agora já não corria para o meu avô. Ia a andar que um jovem de 10 anos tem que manter a postura!
As jogatanas de futebol no jardim do casino mantinham-se, entre corridas de carrinhos Matchbox e Corgy Toys no céu de vidro e corridas da minha Vilar contra a Motobecane do Kiko e a pasteleira do Diogo.
A moeda do dia servia agora para ir à esplanada beber uma groselha ou um capilé ou comer um iogurte natural Ucal, Primor, Veneza ou Lisboa, servidos sempre em boião de vidro.
Na juke box da esplanada ouvia-se o Ob-la-di Ob-la-dá e o Can’t Buy Me Love dos Beatles e o Unchained Melody dos Rigtheous Brothers mas também muitos outros êxitos da Dalida, Rita Pavone, Silvie Vartan, Claude Francois, Charles Aznavour, Sacha Distel e Adamo.
Na entrada Este surgiu mais tarde uma máquina electrónica com um simulador de Fórmula 1 com volante e acelerador. Poucas moedas e tantos bónus!
Já começava a conhecer os miúdos da esplanada e já nos misturávamos nos nossos jogos de ping-pong e nas incursões pelo palmeiral da parada.
Entrei na adolescência e a esplanada foi entreameando períodos abertos com outros fechados, viríamos uma vez reabri-la para fazer os nossos convívios de angariação de fundos para a excursão de finalistas de 1980. Panos pretos nas janelas e limpeza geral e chão encerado em poucas horas! Depois voltou a reabrir e já não era o meu avô João que eu via a passear com os seus amigos. Agora era o meu pai com os seus primos direitos e alguns amigos. O dinheiro que lhe pedia era agora para o café ou para os cigarros às escondidas!
De adolescente tornei-me adulto e agora sento-me na velha e sempre renovada esplanada, de Expresso ou Exame na mão, gozando o sol das meias estações e as sombras dos plátanos, enquanto os meus filhos correm para o parque infantil. As pastilhas que me pedem já não são Pirata, são agora Bubli”$E#%&£#/ qualquer coisa! Os Fruto Real, Laranjina C, Vitasumo, Carbo Cidral e Ginger Ale são agora néctares de pêssego ou alperce e Ice Teas. E até os bolos e sandes já não têm o sabor de outrora. Mas o prazer de estar na esplanada e na velha Aldeia dos Macacos, agora despida de muitos dos seus plátanos, mantém-se intocáveis.
Enquanto isso anseio pela dinamização do parque, pelos concertos Promenade que nunca vêm, pelo Maestro José Atalaya que me encheu a infância e a adolescência, que o parque se torne o nosso Central Park, o nosso Hyde Park, o nosso Serpentine, o nosso Vonderlpark, o nosso Englischer Garten… que nos tornemos uma Brighton e aproveitemos o coreto, a ilha do parque, o roseiral ou os magníficos relvados do parque e os nossos estupendos fins de tarde para incentivarmos e formarmos os nossos filhos no caminho da música e das artes.
O parque já não é o local onde costumava passar todos os meus tempos livres, fosse Verão ou Inverno, fizesse sol ou chuva. Já não é o local onde andava de bicicleta na infância ou jogava ténis na adolescência, onde namorava nos Invernos dos fins de setenta ou tinha aulas nos relvados nas tardes de Primavera. Já não tenho o cinema para ir ver o Trinitá nem a biblioteca para ler o Sandokan ou o Capitão Morgan.
Mas o parque ainda lá está, em todo o seu esplendor, o melhor jardim de Portugal, uma situação única em que uma boa parte da área da cidade é ocupada por um jardim. O parque com o seu lago continua a ter um enorme potencial e a esplanada, tal como a Praça da Fruta para a cidade, é a sua alma, o seu coração.
Já lá estava antes de eu nascer, já lá estava antes do meu pai nascer, já lá estava antes do meu avô nascer! Será testemunha silenciosa da história da minha família, das nossas brincadeiras e dos passeios com os amigos em amena e sorridente cavaqueira e dos nosso passeios bucólicos, solitários e introspectivos.
Um dia serei eu o avô a passear com os amigos (e como irei desfrutar as Caldas!) e serão os meus netos a correrem para mim. E quem sabe se não sentirei então a necessidade de os acolher com um:
- Deus te proteja e te abençoe!
Viravam em direcção ao pequeno lago, onde estão agora mais dois courts de ténis e depois passavam ao longo da rede dos courts do lado do Lisbonense subiam pelas outras escadinhas e entravam na alameda principal, torneando o parque infantil com o seu grande escorrega-castelo de três descidas, o escorrega vermelho mais pequeno, as avionetas vermelhas em baloiço, os outros baloiços, o sobe-e-desce e o carrossel dos cavalinhos, o comboio à entrada, à esquerda, ao lado do trapézio e das argolas sob um suporte azul. E no meio de tudo, o velho ringue de patinagem agora de dimensões mais reduzidas do que outrora fora.
Subiam então a Aldeia dos Macacos passando pela esplanada e pelo coreto onde paravam ganhando forças para um novo circuito.
Eram tardes soalheiras de fim de semana de Verão. A minha mãe e a minha avó jogavam canasta com as amigas no casino e lá em baixo a esplanada enchia-se de outras mães de família em conversa amena enquanto tricotavam uns naperons e pelo canto do olho zelavam pelos seus filhos (os Morgado, Horta, Pereira, Batista e muitos outros) que às dezenas brincavam nas imediações.
O ritual era sagrado. Manhã na praia, aproveitando as marés baixas e caminhando pelas rochas, ou banhos pela mão (o molhar o pé) nas grandes ondas das marés cheias. Manhãs de capacete a brincar às touradas ou a jogar ao prego ou manhãs de sol a comer uma Bola-de-Berlim e a beber uma gasosa no Tábuas azul, junto às escadas de madeira que davam para o largo do Facho. O José Luis , banheiro, montava as barracas brancas com números a cor de vinho e a sua mulher zelava pelo casebre onde depositávamos os enormes sacos de pano onde guardávamos os baldes, pás e colchões de água.
Se almoçávamos na praia tínhamos de ir a correr procurar os pequenos bancos de madeira e os largos estrados de madeira que faziam de tampo de mesa para que os meus avós pudessem comer sentados.
Depois era hora de voltar às Caldas não sem antes ir apanhar mais umas dezenas de caricas no areal por baixo do Tábuas.
Subíamos então as velhas escadas, carcomidas pelo sol, pelo sal e pela areia, passávamos pelo casebre conhecido pela casa dos barcos, onde ainda se alinhavam os dois velhos salva-vidas de madeira, agora destituidos das suas funções pelo asfaltamento da estrada que conduzia ao largo do Facho e pela construção do muro de segurança ao longo da ravina que levava à praia. Seriam precisos oito homens para os remarem e muitos mais para os levar ao areal, à falta dos bois que o faziam originalmente.
Após as 3 das tarde, então sim íamos para o parque, para o casino, onde ficaríamos até serem horas de jantar.
Longas tardes no parque. Pessoas a banhos que alugavam casas e quartos nas imediações do Hospital Termal sentavam-se nas avionetas, os famosos bancos inclinados, ao longo das alamedas. Muitas vezes traziam os filhos, geralmente os netos, com quem estabelecíamos fortuitas amizades de Verão. Vinham as famílias de África onde os pais cumpriam comissões de serviço, e falava-se dos usos e costumes de Angola, Moçambique, Guiné, S. Tomé e mesmo de Timor. Vinham os caldenses residentes nas colónias deixar os filhos com os avós durante as férias ou a preparar o novo ano lectivo. Vinham emigrantes e excursionistas, vinham de todo o lado, visitar as Caldas.
A Aldeia dos Macacos, a velha alameda principal, enchia-se de gente passeando entre os plátanos seculares, jovens estudantes, empregadas domésticas em dia de folga ou fardadas cuidando das crianças e sempre merecendo a atenção dos jovens recrutas do R.I.5, muitos de partida para África e querendo ganhar um novo laço com a metrópole. Madrinhas de guerra, namoradas de guerra!
Por vezes tínhamos a surpresa de um teatro de fantoches, de Robertos, que uns artistas montavam de improvisação, de outra vez era um cigano com um urso amestrado, de unhas limadas e focinho ançaimado ou um tocador de realejo com um macaquinho saguim vestido de paquete de hotel, a recolher as moedas que os adultos lhe deixavam.
Então eu os meus amigos parávamos junto ao grupo do meu avô e eu dava-lhe um forte abraço e o meu avô, como sempre, dava-me um beijo na testa e dizia:
- Deus te proteja e te abençoe!
Nunca me faltou com aquela bênção mesmo que lhe desse mil beijos num dia! Mesmo quando estudava na Universidade e morava na sua casa na Estefânia.
Depois o meu avô levava a mão ao bolso e retirava um pequeno porta moedas de pele castanha e tirava uma moeda de 10 ou de 25 tostões que me dava. Depois voltava a guardar o porta-moedas no bolso para junto de outra carteira onde trazia a fotografia da sua mãe Francisca e uma pequena oração do Padre Cruz. Mesmo ali perto da medalhinha da Nossa Senhora de Fátima que trazia sempre pregada com um pequeno alfinete de dama à camisola interior.
Corríamos então para a esplanada. De cada lado existia um pequeno stand. O primeiro vendia gelados Olá e os pauzinhos podiam conter um prémio, um boneco monocromático dos personagens do Carrocel Mágico, a Anica, o seu cão Franjinhas, o caracol Ambrósio, o feiticeiro mau Saltitão, a vaca Rosália, o coelho Flávio, o Tio Realejo, os amigos Joana e Chico…
O prémio maior era um livro de histórias do Carrocel Mágico ou o próprio Carrocel.
No stand de baixo, no fim da varanda, vendiam-se os gelados da Rajá (É Rajá! É Rajá!) e aqui o prémio eram astronautas e alienígenas sendo o grande prémio (que nunca consegui) a nave espacial que os poderia albergar a todos.
Escolha difícil que tinha que de fazer todos os dias!
Os anos foram passando, agora já não corria para o meu avô. Ia a andar que um jovem de 10 anos tem que manter a postura!
As jogatanas de futebol no jardim do casino mantinham-se, entre corridas de carrinhos Matchbox e Corgy Toys no céu de vidro e corridas da minha Vilar contra a Motobecane do Kiko e a pasteleira do Diogo.
A moeda do dia servia agora para ir à esplanada beber uma groselha ou um capilé ou comer um iogurte natural Ucal, Primor, Veneza ou Lisboa, servidos sempre em boião de vidro.
Na juke box da esplanada ouvia-se o Ob-la-di Ob-la-dá e o Can’t Buy Me Love dos Beatles e o Unchained Melody dos Rigtheous Brothers mas também muitos outros êxitos da Dalida, Rita Pavone, Silvie Vartan, Claude Francois, Charles Aznavour, Sacha Distel e Adamo.
Na entrada Este surgiu mais tarde uma máquina electrónica com um simulador de Fórmula 1 com volante e acelerador. Poucas moedas e tantos bónus!
Já começava a conhecer os miúdos da esplanada e já nos misturávamos nos nossos jogos de ping-pong e nas incursões pelo palmeiral da parada.
Entrei na adolescência e a esplanada foi entreameando períodos abertos com outros fechados, viríamos uma vez reabri-la para fazer os nossos convívios de angariação de fundos para a excursão de finalistas de 1980. Panos pretos nas janelas e limpeza geral e chão encerado em poucas horas! Depois voltou a reabrir e já não era o meu avô João que eu via a passear com os seus amigos. Agora era o meu pai com os seus primos direitos e alguns amigos. O dinheiro que lhe pedia era agora para o café ou para os cigarros às escondidas!
De adolescente tornei-me adulto e agora sento-me na velha e sempre renovada esplanada, de Expresso ou Exame na mão, gozando o sol das meias estações e as sombras dos plátanos, enquanto os meus filhos correm para o parque infantil. As pastilhas que me pedem já não são Pirata, são agora Bubli”$E#%&£#/ qualquer coisa! Os Fruto Real, Laranjina C, Vitasumo, Carbo Cidral e Ginger Ale são agora néctares de pêssego ou alperce e Ice Teas. E até os bolos e sandes já não têm o sabor de outrora. Mas o prazer de estar na esplanada e na velha Aldeia dos Macacos, agora despida de muitos dos seus plátanos, mantém-se intocáveis.
Enquanto isso anseio pela dinamização do parque, pelos concertos Promenade que nunca vêm, pelo Maestro José Atalaya que me encheu a infância e a adolescência, que o parque se torne o nosso Central Park, o nosso Hyde Park, o nosso Serpentine, o nosso Vonderlpark, o nosso Englischer Garten… que nos tornemos uma Brighton e aproveitemos o coreto, a ilha do parque, o roseiral ou os magníficos relvados do parque e os nossos estupendos fins de tarde para incentivarmos e formarmos os nossos filhos no caminho da música e das artes.
O parque já não é o local onde costumava passar todos os meus tempos livres, fosse Verão ou Inverno, fizesse sol ou chuva. Já não é o local onde andava de bicicleta na infância ou jogava ténis na adolescência, onde namorava nos Invernos dos fins de setenta ou tinha aulas nos relvados nas tardes de Primavera. Já não tenho o cinema para ir ver o Trinitá nem a biblioteca para ler o Sandokan ou o Capitão Morgan.
Mas o parque ainda lá está, em todo o seu esplendor, o melhor jardim de Portugal, uma situação única em que uma boa parte da área da cidade é ocupada por um jardim. O parque com o seu lago continua a ter um enorme potencial e a esplanada, tal como a Praça da Fruta para a cidade, é a sua alma, o seu coração.
Já lá estava antes de eu nascer, já lá estava antes do meu pai nascer, já lá estava antes do meu avô nascer! Será testemunha silenciosa da história da minha família, das nossas brincadeiras e dos passeios com os amigos em amena e sorridente cavaqueira e dos nosso passeios bucólicos, solitários e introspectivos.
Um dia serei eu o avô a passear com os amigos (e como irei desfrutar as Caldas!) e serão os meus netos a correrem para mim. E quem sabe se não sentirei então a necessidade de os acolher com um:
- Deus te proteja e te abençoe!
O Carrocel Mágico - Genérico
Cat Stevens - Father and Son Original
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