Os slows na nossa adolescência constituíam o momento mais esperado em qualquer festa ou noite (e tarde!) de discoteca.
No auge da nossa irreverência, chegámos a fazer festas só de slows (ehehehe!).
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Carpet Crawlers dos Genesis, Nights in White Satin dos Moody Blues, Whiter Shade of Pale dos Procol Harum, Love Hurts dos Nazareth, Hotel California dos Eagle e Unchained Melody dos Righteous Brothers eram dos slows mais tocados mas centenas de outros ficaram nas nossas recordações, associando-se muitos deles a pessoas ou momentos especiais.
Alguns slows ficaram como sendo dos primeiros que dancei, como Angie dos Rolling Stones e Soon dos Yes. Mas muitos outros dos Chicago, Air Supply, 10CC e Peter Frampton recordam-me aquelas primeiras festas de aniversários (ou para comemorar a tomada de Lisboa aos Mouros! Ou a passagem do Cabo Bojador, eheheh!)
O slow não era coisa despiciente, era uma actividade muito séria para ser levada de forma muito competente e profissional. O verdadeiro slow demorava anos de prática até conhecermos todas as manhas e truques do ofício e a reconhecer todos os sinais comunicados pela parceira de dança.
O verdadeiro exame da quarta-classe era o Je T’Aime Moi Non Plus do Serge Gainsbourg com a Jane Birkin. Era a prova de fogo quando era permitido tocá-la (muitos discos confiscados!).
Fosse qual fosse o andamento da música, o profissional do slow comandava o seu próprio navio e a velocidade do cruzeiro! O cavalheiro, se era artista e a dama cúmplice, conseguia a proeza de dançar durante quatro minutos e meio sem sair do mesmo sítio. E isso, meus amigos, é obra!
O slow servia também para, de uma forma um pouco mais discreta do que levar uma nega daquelas, avaliar o grau de atracção e interesse que havia para connosco por parte da donzela. Quando a moçoila aceitava dançar connosco um slow e o grau de intimidade não era muito, isso era meio caminho andado para irmos tomar juntos um Ginger Ale com limão no primeiro andar da Taiti ou dar um passeio até à Aberta (que naquela altura era longe como o caraças!)
A forma como a Ginger Rogers dançava connosco também dizia muito do seu interesse. As menos interessadas espetavam-nos a mão por alturas do apêndice num movimento a que generosamente chamavam de Travão (e garanto-vos que para activar a Embraiagem era cá preciso uma lábia!).
Quando pretendiam um ainda maior afastamento impunham-nos logo a mão direita para dar à nossa esquerda (ou vice-versa) e parecíamos que íamos dançar a Valsa.
O menor ou maior estiramento do braço informava-nos da condição da tal atractividade que ia do frio ao gelado.
Com o braço completamente esticado, o capitão parecia comandar um galeão com os seus dois mastros centrais e o mastro de proa, o gurupés, com a respectiva vela de estai (as mangas da blusa da dita!)
Se nos apanhássemos todos nessa situação – e isso era muito frequente nos bailes das aldeias em que íamos convidar as moçoilas sem as conhecer – parecíamos a Invencível Armada de galeões rumo a Inglaterra!
Digo-vos, o bracinho esticado é bom para dançar a valsa ou o tango a dois mas nunca um slow!
No inicio dos slows, contávamos as cabeças e caso estivéssemos em maior número, apressávamo-nos a convidar as raparigas. Claro que havia um balanço entre o vencer a timidez e de ser o primeiro a ganhar coragem para convidar a jeitosa e o facto de não querermos ficar para o fim.
Se ficávamos descalços sem par para dançar, então íamos buscar a vassoura e começava a dança da vassoura que me lixava sempre o esquema.
O artista que ficava para trás pegava numa vassoura e após uns segundos entregava-o ao desgraçado que estaria a dançar com a miúda desejada pelo vassoureiro. O novo artista da vassoura passava-o a outro e tomava o seu lugar na dança e assim sucessivamente em estilo ‘’passa a outro mas não ao mesmo!).
O melhor mesmo era arranjar amigas suficientes para meter o raio da vassoura no fundo da dispensa!
Lembro-me de vários slows memoráveis e de um particularmente divertido. No dia de estreia da Sunset o quadro de luz não aguentou e por várias vezes faltou a luz. Uma das falhas apanhou-me em pleno slow com uma amiga de uma amiga que acabara de conhecer.
Não sei quanto tempo durou o apagão mas sei que continuámos com o slow até a música e a luz retornarem. Afinal a música era apenas um acessório! Ehehehe!
Mas o slow servia também de arma para elas. Éramos usados e abusados para fazer ciúmes a terceiros e às vezes caíamos na esparrela sem perceber.
Lembro-me que numa tarde de domingo de Inverno, juntámo-nos quatro amigos e no ‘’Bora lá tomar um copo que é já ali!’’ fomos até ao Kiay em Meirinhas, na Nacional 1 entre Leiria e Pombal.
Passados alguns minutos já estávamos em amena cavaqueira com a população feminina local quando começaram os slows.
Eu, todo lampeiro, decidi-me pela mais bonita e lá a convidei para dançar.
Mal entrámos na pista de dança e ainda no primeiro slow, o DJ decide fazer uma mudança brusca para uma música de dança! Entreolhámo-nos com surpresa e sorrindo voltámos até ao bar onde se encostavam os nossos amigos.
Passado uma meia-hora, nova onda de slows e nova ida para a pista de dança. Quase ainda não me tinha adaptado às circunstâncias quando o DJ volta a meter um rock!
– ‘’Ai o caraças!’’ pensei eu para comigo. – Ficámos todos a olhar para o DJ que nem levantou a cabeça da mesa de misturas.
Apesar de alguns protestos lá recomeçaram todos a dançar bem afastados e eu voltei à primeira forma.
À terceira vez que o DJ colocou slows quase que nem dei tempo para aquecer, agarrei a rapariga pelo braço e ala que se faz tarde para a pista de dança.
Desta vez não teve piada, o camarada voltou a mudar a música e ficou a olhar para mim com um ar de gozo. Então a minha recente e muito efémera amiga arrancou em passo firme para o DJ, discutiu e acabou a fazer-lhe festinhas na cabeça da forma mais pindérica, pirosa e Tony Carreira que possam imaginar!
Afinal havia outro! A excelentíssima era namorada do DJ, tinham-se zangado e estava a tentar provocá-lo fazendo ciúmes à minha custa.
Também eu devia ter adivinhado. Queria que me saísse o Totoloto sem ter primeiro preenchido o boletim!
Durante cerca de um ano, escrevi regularmente no espaço do Facebook com o mesmo nome, as crónicas que descreviam os principais eventos que presenciei de 1968 a 1986. É a minha vida mas também é o retrato de uma época. Alguns amigos ajudaram-me com alguns textos nessa tarefa e este espaço estará sempre aberto a novas partilhas. As crónicas daquilo que eu queria ter contado já terminaram mas o espírito de grupo de todos os que nelas se reconhecem, continuará para sempre.
quarta-feira, 5 de maio de 2010
SLOWS E ALGUNS TERMOS NÁUTICOS
Jane Birkin & Serge Gainsbourg - Je T'aime... Moi Non Plus
Publicada por
Paulo Caiado
à(s)
19:10
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