terça-feira, 10 de agosto de 2010

O POÇO DA MORTE

O POÇO DA MORTE 
 3º TEXTO COMPLEMENTAR
À CRÓNICA '' CAÇADA NA MATA REAL''




O POÇO DA MORTE

Reportagem do Jornal do Algarve


Adelino Henriques percorre as feiras algarvias com o seu poço da morte


A arte de ganhar a vida a brincar com a morte "Nunca soube o que é o medo", afirma Adelino Henriques, o famoso artista do Poço da Morte. Tem 79 anos, mas a idade não é um impedimento para continuar a fazer aquilo que mais gosta. Apaixonado desde sempre pelo Poço da Morte um "divertimento" que tem tanto de sedutor como de arriscado, em que um pequeno deslize pode ser fatal. Uma "paixão cega" que fez com que este homem passasse a vida a brincar com a morte.

Ana Rosa - 13 de Novembro de 2009


O famoso Poço da Morte, uma das diversões mais antigas do país, anda a percorrer as feiras algarvias. E se o espectáculo já é por si só um verdadeiro "show" de emoções e adrenalina, o que se dirá quando o artista principal tem 79 anos. Adelino Henriques, é a estrela deste espectáculo único que deixa o público com aquele "nervoso miudinho". O J A aproveitou a presença do artista na região e foi conhecer um pouco melhor o "homem sem medo".

Natural de Mangualde, concelho de Viseu, Adelino teve o primeiro contacto com o Poço da Morte aos oito anos, na feira de São Mateus, em Viseu.

"Na altura não fazia bem ideia do que isto era, mas comecei a sonhar todos os dias que era um dos artistas do poço", recorda. Aos 18 anos, numa feira em Aveiro, surgiu-lhe a oportunidade com que tanto sonhara. Começou a andar no Poço da Morte primeiro com uma bicicleta a pedal e logo depois com uma motorizada, aprendendo também a trabalhar na Esfera da Morte. Aqui o espectáculo é feito numa bola redonda feita de ferro.

Aos 40 anos mandou construir o seu próprio poço e, desde aí, este passou a ser o seu ganha-pão, acompanhando-o de norte a sul do país. Passados 40 anos, continua a ganhar a vida com o Poço da Morte.

"Nunca me imaginei a fazer mais nada", frisa.

Para aqueles que nunca tiveram a oportunidade de assistir ao extraordinário espectáculo, que desafia todas as leis da gravidade, o J A levanta aqui a "pontinha do véu".


O Poço da Morte é uma estrutura feita em madeira com cerca de sete metros de altura. Em redor do poço é montado um estrado, de onde o público poderá assistir ao espectáculo. Os artistas ao volante de uma motorizada movem-se em círculos à volta do poço, a cerca de sete metros do chão.

Não são utilizados capacetes, colchões ou qualquer outra protecção, o que significa que qualquer deslize pode resultar numa queda que pode ser fatal. As motos atingem velocidades de 90 quilómetros por hora.

E como se não bastasse a espectacularidade do momento, os artistas vão ainda mais longe. Sempre com os motores a trabalhar, ousam tirar os braços do guiador e mesmo a tapar os olhos com vendas. O objectivo aqui é impressionar e para isso vale tudo, até brincar com a morte. Actualmente, Adelino e o seu companheiro de cena fazem o espectáculo com uma Suzuki e uma Yamaha.

"Estas são motos vulgares, sem qualquer tipo de apetrecho ou modificação", explica o artista do Poço da Morte. "Apaixonei-me pelo Poço da Morte"


Adelino Henriques contou até há bem pouco tempo com a colaboração de um dos seus netos, que o acompanhava nas destemidas aventuras. Hoje é Carlos Silva, de 30 anos, um "velho" amigo da família que acompanha o experiente artista nas suas actuações.

"As actuações em dupla são ainda mais espectaculares aos olhos do público", diz Adelino.

O artista é actualmente o homem mais idoso do mundo a fazer o Poço da Morte. E apesar da insistência dos quatro filhos, que, preocupados, tentam convencê-lo a mudar de vida, Adelino não se dá por vencido: "Espero continuar a fazer o Poço da Morte enquanto a minha saúde o permitir". Mas o que leva uma pessoa a arriscar assim a vida, perguntam alguns. Pois foi essa a questão que o J A colocou a Adelino Henriques, que respondeu simplesmente:

"Faço isto porque gosto. Apaixonei-me pelo Poço da Morte! Nunca senti medo, não sei o que é o medo. Sinto-me muito bem quando estou lá dentro, gosto de ouvir os aplausos das pessoas", revela.

Apesar de nunca ter "apanhado um grande susto", já deu umas valentes quedas.

"Já fracturei braços e pernas várias vezes. Tenho uma placa de platina na perna. Mas nada de grave!" Ossos do ofício! O artista revelou ainda ao JA factos curiosos, como por exemplo que nunca houve uma companhia de seguros que fizesse um seguro a um artista do Poço da Morte. Créditos à habitação e outros bens também não são permitidos a estes artistas. Vivem no limite, sem qualquer tipo de seguro!

"Já cheguei a entrar dentro do poço agarrado a duas muletas"

Adelino continua com a mesma destreza, apesar dos seus quase oitenta anos. Embora o problema do reumatismo lhe ande a trocar as voltas. "Já cheguei a entrar dentro do poço agarrado a duas muletas. As pessoas pensavam que era maluco", conta, divertido.Contudo, Adelino Henriques sabe que o dia em que terá que abandonar o seu "amado" poço não tarda.

"Gostava muito que isto continuasse. Os meus filhos aprenderam todos a andar no Poço da Morte", mas acabaram por enveredar por outras profissões".

"É uma pena que os jovens de hoje não queiram aprender um ofício. Esta é uma profissão como outra qualquer", diz. Com o senão de que cada dia pode ser o último!

Já houve quatro Poços da Morte em Portugal. O primeiro chegou pelas mãos de uns italianos, que depois o venderam a uns portugueses. O poço de Adelino Henriques é, actualmente, o único Poço da Morte no país, e também o maior poço que alguma vez existiu em Portugal. Apesar de actuar mais frequentemente na zona norte do país, Adelino e o seu poço decidiram descer este ano ao Algarve e já passaram pelas feiras de Olhão, Tavira, Vila Real de Santo António e Silves.



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