segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A CAMINHO DA ADOLESCÊNCIA - LINGUAGENS SECRETAS


Entrei na sala de aula e vi a Teresa Lamy passar meio às escondidas à Marina um papelinho dobrado em quatro.

Não gostei! A Teresa não costumava esconder-me muitas coisas e pensei logo que estivesse a guardar um segredo naquela troca de correspondência.

Julgo que durante todo o dia, eu e os outros rapazes tentámos obter da Marina aquela mensagem. Não tivemos qualquer sucesso em arrancá-lo da nossa colega mas eu consegui vislumbrar o texto quando ela o abriu durante uma aula.

Não consegui entender nada do que estava escrito e pensei que era apenas uma partida das raparigas.


Nos outros dias começaram a circular cada vez mais papéis entre as raparigas e as aulas do Ciclo agitaram-se entre trocas de mensagens e risadas de cumplicidade entre as colegas.

Começámos a ficar fartos de sermos gozados com a situação e não descansámos até compreender o que se passava.

Um olhar de esguelha por cima do ombro da colega da frente mostrávamo-nos um texto escrito numa linguagem desconhecida. De inicio pensávamos sinceramente que estavam a gozar connosco mas percebemos que elas realmente entendiam o conteúdo das mensagens e faziam uma verdadeira troca de correspondência entre si. Será que elas tinham aprendido com alguém uma língua nova para além do Francês que estudávamos? Inglês sabíamos que não era pois começáramos a aprender algumas palavras nesta língua. Espanhol também não. Seria alemão?


Virámo-nos para o António José que vivera na Alemanha e pedimos que escrevesse umas frases nessa língua. Nã! Não era nada parecido! Que mistério se passava pelos corredores, recreios e salas de aula da Escola Comercial?

Finalmente o Luis Rebelo Sancho ou o Tó-Zé Cavaco, não lembro quem, conseguiu arrancar das mãos da Luisa Branco um desses malfadados papeis e trouxe-o vitorioso até nós!

Não compreendemos nada à primeira e pensámos que definitivamente estavam apenas a gozar connosco, até que um olhar mais atento do Joaquim Franco trouxe a descoberta.


- Elas estão a utilizar os ‘’pês’’ depois de cada sílaba. Escrevem ‘’pê’’ e depois as vogais da sílaba anterior! Vêem?! – Exclamou ele com um sorriso triunfante.

‘’Enpenconpontranpanmopo-nospos àpá sapaípidapa’’

Olhámos todos para o papel, soletrando as sílabas e finalmente entendemos a cifra.

Elas não falavam outra língua. Era a mesma coisa, só que cada sílaba começava com “pê”. Nada mais tolo!

Decifrado o mistério decidimo-nos vingar e encarregámos o Franco de encontrar uma linguagem cifrada só para nossa utilização.


Um dia depois surgiu com um texto e o seu código. Algo simples mas que servia para a nossa vingança:

1S M2N3N1S T2M 1 M1N31 Q52 S14 2SP2RT1S M1S N4S S4M4S M2LH4R2S!

Era tão simples de traduzir (conseguem fazê-lo?) e contudo as raparigas levaram dias a decifrá-lo (ok. estou a exagerar! Foi apenas um dia....umas horas, tá bem , pronto! Foi uma questão de minutos!) e de qualquer maneira o Joaquim Franco todos os dias aparecia com uma nova linguagem cifrada. Uma por exemplo consistia em iniciar um texto com um digito ( 3, por exemplo) e um sinal de + ou de -, escrever nas letras que fossem três números à frente ou atrás consoante a indicação. Assim:

(3+) COMPREENDERAM A MENSAGEM? FRPSUHHQGHUDP D PHQVDJHP?


Bem, mas enquanto nós desenvolvíamos linguagem cada vez mais encriptadas e mais difíceis de entender e de escrever (até por nós!) as raparigas passaram a utilizar uma nova linguagem em que a vogal ‘’a’’ era complementada com o sufixo ‘’aix’’, o ‘’e’’ com o ‘’eber’’, o ‘’i’’ com ‘’ifix’’, o ‘’o’’ com ‘’ober’’ e o ‘’u’’ com ‘’ufux’’.

Assim,

Ober meberufux naixmoberraixdober eber maixsifixs gifixrober qufuxeber ober teberufux!
(O meu namorado é mais giro que o teu!)

Enfim! Uma guerra sem quartel!

Aos poucos e poucos a moda foi alastrando e até brincadeiras da língua inglesa como a Pig Latin foram utilizadas por alguns.



O Pig Latin consiste em colocar a primeira letra da palavra no final desta e acrescentar a partícula +ay.  A razão desta mudança talvez seja para obter uma melhor sonoridade, já que a língua inglesa não é uma língua latina.


Por exemplo: I like to speak Pig Latin.    Ficaria:  Iay Ikelay otay peaksay Igpay Atinlay.



OU ISTO OU AQUILO


de: Cecilia Meireles

Oupou sepe tempem chupuvapa epe nãopão sepe tempem solpol
Oupo sepe tempem solpol epe nãopão sepe tempem chupuvapa!
Oupo sepe calpalçapa apa lupuvapa epe nãopão sepe põepõe opo apanelpel,
Oupou sepe põepõe opo apanelpel epe nãopão sepe calpalçapa apa lupuvapa!
Quempem sopobepe nospos arespares nãopão fipicapa nopo chãopão
Quempem fipicapa nopo chãopão nãopão sopobepe nospos arespares!
Épé upumapa granpandepe pepenapa quepe nãpão sepe popossapa espestarpar
Aopao mespesmopo tempempopo nospos doispois lupugaparespes!

(…)



Conseguiste decifrar? PAPARAPABÉNSPÉNS!




OU ISTO OU AQUILO

De: Cecília Meireles

Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!
Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranquilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.




Mas falar com os Pês tem muito que se lhe diga. Há muito tempo surgiu um texto de autor anónimo que não utilizava a linguagem dos Pês mas fazia uma autêntica elegia à letra Pê.

PEDRO PAULO PEREIRA PINTO

Pedro Paulo Pereira Pinto, pequeno pintor, português, pintava portas, paredes, portais. Porém, pediu para parar porque preferiu pintar panfletos.
Partindo para Piracicaba, pintou prateleiras para poder progredir.
Posteriormente, partiu para Pirapora. Pernoitando, prosseguiu para Paranavaí, pois pretendia praticar pinturas para pessoas pobres. Porém, pouco praticou, porque Padre Paulo pediu para pintar panelas, porém posteriormente pintou pratos para poder pagar promessas. Pálido,porém personalizado, preferiu partir para Portugal para pedir permissão para papai para permanecer praticando pinturas, preferindo, portanto, Paris.
Partindo para Paris, passou pelos Pirineus, pois pretendia pintá-los. Pareciam plácidos, porém, pesaroso, percebeu penhascos pedregosos, preferindo pintá-los parcialmente,pois perigosas pedras pareciam precipitar-se principalmente pelo Pico, porque pastores passavam pelas picadas para pedirem pousada, provocando provavelmente pequenas perfurações, pois, pelo passo percorriam, permanentemente, possantes potrancas.
Pisando Paris, permissão para pintar palácios pomposos, procurando pontos pitorescos, pois, para pintar pobreza, precisaria percorrer pontos perigosos, pestilentos, perniciosos, preferindo Pedro Paulo precaver-se. Profundas privações passou Pedro Paulo.
Pensava poder prosseguir pintando, porém, pretas previsões passavam pelo pensamento, provocando profundos pesares, principalmente por pretender partir prontamente para Portugal. Povo previdente! Pensava Pedro Paulo…
Preciso partir para Portugal porque pedem para prestigiar patrícios, pintando principais portos portugueses.
- Paris! Paris! Proferiu Pedro Paulo. -Parto, porém penso pintá-la permanentemente, pois pretendo progredir.
Pisando Portugal, Pedro Paulo procurou pelos pais, porém, Papai Procópio partira para Província.
Pedindo provisões, partiu prontamente, pois precisava pedir permissão para Papai Procópio para prosseguir praticando pinturas. Profundamente pálido, perfez percurso percorrido pelo pai. Pedindo permissão, penetrou pelo portão principal. Porém, Papai Procópio puxando-o pelo pescoço proferiu:
- Pediste permissão para praticar pintura, porém, praticando, pintas pior.
Primo Pinduca pintou perfeitamente prima Petúnia. Porque pintas porcarias?
- Papai, – proferiu Pedro Paulo – pinto porque permitiste, porém, preferindo,poderei procurar profissão própria para poder provar perseverança, pois pretendo permanecer por Portugal.
Pegando Pedro Paulo pelo pulso, penetrou pelo patamar, procurando pelos pertences, partiu prontamente, pois pretendia pôr Pedro Paulo para praticar profissão perfeita: pedreiro! Passando pela ponte precisaram pescar para poderem prosseguir peregrinando. Primeiro, pegaram peixes pequenos, porém, passando pouco prazo, pegaram pacus, piaparas, pirarucus.
Partindo pela picada próxima, pois pretendiam pernoitar pertinho, para procurar primo Péricles primeiro. Pisando por pedras pontudas, Papai Procópio procurou Péricles, primo próximo, pedreiro profissional perfeito. Poucas palavras proferiram, porém prometeu pagar pequena parcela para Péricles profissionalizar Pedro Paulo. Primeiramente Pedro Paulo pegava pedras, porém, Péricles pediu-lhe para pintar prédios, pois precisava pagar pintores práticos. Particularmente Pedro Paulo preferia pintar prédios. Pereceu pintando prédios para Péricles, pois precipitou-se pelas paredes pintadas.
Pobre Pedro Paulo, pereceu pintando… Permita-me, pois, pedir perdão pela paciência, pois pretendo parar para pensar… Para parar preciso pensar. Pensei. Portanto, pronto, pararei.

Postado por Paulo (papaupulopo capaiapiadopo)


Quanpandopo eupeu eperapa criprianpançapa, upusapavapa muipuitopo apa linpingupuapa dopo Pêpê paparapa fapalarpar compom aspas mipinhaspas irpirmãspãs.

Bopoaspas repecorpordapaçõpõespes!


Da Wikipédia:

No Brasil a lingua dos Pês é escrita ao contrário. Consiste em se introduzir a consoante P seguida pela vogal precedente (e algumas consoantes - como o m, n, r, s, etc) de cada um dos fonemas da frase.

Por exemplo a frase: Quando eu era criança, usava muito a língua do P para falar com meus irmãos.
Ficaria: Panquan podo peueu pee para picri panan paça, puu pasa pava puimui poto paa pinlin puagua podo pePe papa para pafa parlar pomcom peme pusus pirir pãmã posos.


História da Lingua dos Pês:

Pesua peoperipegem perrepemonpeta pea Pessepegunpeda Pegueperra Pemunpedipeal, pequanpedo pessolpedapedos peapelipeapedos, peprepecipesanpedo pede peupema peforpema pede pesse pecopemupenipecar pecom pesseus pecompepapenheiperos pessem pesseperem peenpetenpedipedos pepepelos peipenipemipegos, pecripeaperam peupema pelínpegua peque pesseperia peepexapetapemenpete peipegual pea pelínpegua penapetipeva pedepeles, pepoperém peapecrespecenpetanpedo pea pessípelapeba pepe peanpetes pede pecapeda pessípelapeba pede pecapeda pepapelapevra pea pesser pedipeta.




No mundo cultural germânico existem várias formas de línguas infanto-juvenís similares a nossa Língua do Pê.
Na Alemanha, por exemplo, a mais conhecida e celebrada delas se chama Löffelsprache (Löleföf elefel spralefach elefe) que traduzido literalmente quer dizer Língua da Colher (Löffel = colher + Sprache = língua). Já na Suíça alemã existe uma língua similar em sua natureza que se chama Matteänglisch ou Mattenenglisch (Itteme-Inglische) que quer dizer 'língua falada num lugar chamado Matte'.
Vale notar que até existe literatura produzida nestas línguas. Também existem clubes de aficionados. Apesar de terem surgido na Europa, e no caso do Matteänglish mais especificamente na área de Berna, na Suíça, existem falantes desses idiomas 'construídos' em vários países do mundo para onde imigraram europeus de origem teuta (i.e. Brasil, Estados Unidos, etc.).




TEXTO COMPLEMENTAR À CRÓNICA
‘’A CAMINHO DA ADOLESCÊNCIA- LINGUAGENS SECRETAS''


Sabiam que existem realmente língua artificiais que são faladas por milhares de pessoas em todo o mundo? Desde o século 17 que se criam idiomas artificiais. E não se trata apenas das falas do quotidiano modificadas devido ao calão, e sim de idiomas completamente lógicos e complexos. Contudo a maioria não caiu no gosto popular.


No livro In The Land of Invented Languages (“Na Terra das Línguas Inventadas”) Arika Okrent cita mais de 500 idiomas extintos por falta de utilizadores. Mas entre esses idiomas artificiais alguns ainda permanecem hoje com milhares de falantes, desses que não morreram os mais populares são:


Esperanto

Criado por: L.L. Zamenhof, em 1887.

Origem: Construído a partir de palavras semelhantes em várias línguas, o esperanto foi criado para servir de idioma universal e promover a paz e a fraternidade entre as nações. Daí o nome, que significa “esperançoso”.
Inspiração: Vocabulários das línguas latinas, pronúncia das línguas eslavas.
Falantes: 200 mil.


Klingon

Criado por: Mark Okrand, em 1982.

Origem: Feita por encomenda para o 3° filme da série Star Trek – os produtores queriam que a raça guerreira dos Klingons falasse uma língua completa em vez dos grunhidos de sempre. Com os fãs, o idioma ganhou vida própria. Existe até o Instituto da Língua Klingon, que publicou uma tradução de Hamlet.
Inspiração: Sons guturais, com a intenção de soar alienígena.
Falantes: 20 mil


Sindarin

Criado por: J.R.R. Tolkien, 1920-1940.

Origem: Criar línguas era um passatempo do jovem Tolkien, que a partir delas inventou um mundo inteiro: o universo mítico de O Senhor dos Anéis, onde Sindarin é apenas o mais falado dos vários idiomas da raça dos elfos.
Inspiração: Galês.
Falantes: 10 mil



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