sexta-feira, 4 de junho de 2010

HISTÓRIA DO LADO OESTE



As rivalidades entre grupos de jovens que referi na crónica ‘’A Manjedoura’’ tiveram origem muitas décadas atrás.
Inicialmente nos anos 40 e 50 essa rivalidade foi criada entre os jovens que cessavam a sua actividade estudantil após a quarta classe e ingressavam logo após na vida activa (recordo que não havia legislação que impedisse o trabalho antes dos 16 anos) e os estudantes que ingressavam na Escola Industrial e Comercial para os cursos técnicos.
Mesmo dentro da Escola fazia-se sentir a rivalidade entre os alunos ‘’limpinhos’’ da área comercial e os alunos ‘’cheios de óleo’’ da área industrial, cada um com as suas batas características e adequadas aos seus estudos.
Com a necessidade de ser criada uma escola que permitisse aos alunos o grau de preparação para ingressarem no ensino superior e na ausência de um liceu, foram criados vários colégios privados sendo o mais famoso e perene o Externato Ramalho Ortigão que conheceu várias localizações.
A rivalidade dos alunos da Escola Industrial e Comercial transferiu-se então para os alunos do Ramalho Ortigão.
Surgiram entretanto alguns factores exógenos a manter essa rivalidade. Os alunos da Escola Industrial e Comercial pretendiam efectuar cursos técnicos que lhes dariam acesso imediato à actividade profissional, os alunos do colégio seguiam um grau de ensino intermédio que lhes daria acesso ao ensino superior, às licenciaturas.
Existe pois um factor social e económico a condicionar a escolha do tipo de ensino. Os alunos oriundos das famílias mais pobres eram condicionados a tirar um curso rápido que lhes daria acesso à actividade profissional a curto prazo e não tinham recursos para poder ir para as grandes cidades e manter-se aí na condição de estudantes. Com algumas excepções, os estudantes oriundos das famílias mais abastadas iam para o colégio e os das famílias com menos recursos iam para a escola.
Entretanto e em termos demográficos verifica-se que a expansão das Caldas faz-se para Oeste com a criação do Bairro do Além da Ponte e mais tarde do Bairro dos Arneiros, povoados sobretudo pelas classe operárias; e para Este, na Encosta do Sol, que será habitada sobretudo por pequenos empresários e profissionais liberais. A própria tipologia das casas assim o demonstra.
A estratificação social vincada dos anos 40 a 70 condiciona as relações entre alunos e os próprios namoros de casais oriundos de escolas diferentes não são vistos com bons olhos!
Em meados dos anos setenta surge o Liceu e por via disso é extinto o Colégio. A população tinha agora acesso ao ensino intermédio oficial e estatal de carácter gratuito.
E a rivalidade entre escolas transfere-se agora para o Liceu.
A rivalidade entre alunos das áreas industriais e comerciais da Escola começa a diluir-se na partilha de uma identidade comum e essa rivalidade é apontada exclusivamente ao Liceu.
Quem ainda viveu esses tempos dos anos 70 em que a ida a um dos convívios organizados pela escola rival gerava algumas ‘’susceptibilidades’’ que eram agravadas quando nos metíamos com alunas da outra escola, sabe do que eu estou a falar!
E nem vale a pena esconder muito o sol com a peneira, as clivagens no período do pós-25 de Abril aumentaram com as opções de ordem política.
A própria Praça da Fruta era um micro-cosmos que reflectia a realidade caldense da altura. Se os jovens dos anos 60 agora repartiam-se entre os Cafés Central (os ‘’intelectualoides de esquerda’’!) e a Zaira (o ‘’ninho das víboras’’ e os ‘’fascistas’’!), os dos anos 70 mantinham a sua divisão entre a Zaira e o Convivio. Neste ponto apenas o Camaroeiro Real (os rapazes) e a Machado (as raparigas) os unia!
Entretanto, mesmo no interior do Liceu e com a criação do ensino unificado começam a ser criadas facções, agora já não pela tipologia do curso mas pela área de residência.
A democracia, a melhoria das condições económicas e sociais, a diluição progressiva da estratificação social, permitiu que os alunos oriundos das famílias menos abastadas e residentes nas áreas da zona oeste, acedessem também ao Liceu e com isso trouxessem a rivalidade – baseada sobretudo na sua identidade cultural e até politica – para o interior do próprio Liceu.
Não é uma rivalidade baseada em disputas fisicas ou em actos de segregação total no espaço escolar mas num espirito de grupo, de clã, que os coloca em diferentes lados da barreira na convivência fora dessas portas.
E é nesse momento da história da juventude caldense que se passam os factos relatados na minha crónica ‘’A Manjedoura’’.


Streets Of Fire Theatrical Trailer




Diane Lane - Tonight Is What It Means To Be Young

Sem comentários: